quinta-feira, 30 de junho de 2011

Cordel na Universidade

Professor Galdino, Eu, Professora Andrea e a Vice-Reitora Maria Elias

FALANDO DE CORDEL NA UNILAB

Ontem, 29 de junho de 2011, estive na UNILAB - Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira - conversando sobre Literatura de Cordel e declamando algumas coisas para professores, alunos, gestores e servidores.

Foi uma bonita festa de São Pedro que o pessoal da UNILAB fez (veja mais). Tiveram a delicadeza de me convidar para por um pouco de Cordel na festa. Gostei da experiência.

A UNILAB está localizada no município de Redenção no Estado do Ceará e está a 66 km de distância da capital Fortaleza, aproximadamente 1h de carro seguindo pela rodovia CE-060. O nome da cidade "REDENÇÃO" veio para servir de exemplo como primeiro município brasileiro a abolir a escravidão anos antes da Lei Áurea. Para saber mais sobre seu trabalho, é só visitar o site em http://www.unilab.edu.br/

Agradeço a todos da UNILAB pela oportunidade e espero voltar em breve para continuarmos a prosa.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Poesia de Dalinha Catunda


MEU VESTIDO DE SÃO JOÃO

*
Foi Mexendo em meus guardados
E fazendo arrumação
Que encontrei embrulhado
Meu vestido de São João
Um vestidinho singelo.
Mas eu considero belo
E logo voltei ao sertão.
*
Eu sinto tanta saudade,
Das velhas festas juninas
Onde eu era bem feliz
Junto com outras meninas
Ensaiando nossas danças
Organizando as festanças
Tipicamente nordestinas.
*
Vestia-me de matuta,
Com meu vestido de chita
Nos cabelos duas tranças
Nas tranças laço de fita.
De palha era meu chapéu
E eu me sentia no céu,
Não conhecia desdita.
*
O fogo unia famílias
Fogueira era tradição
O casamento matuto
Não faltava no são João
E o bom forró que rolava
Quando a gente rebolava
Era do rei do Baião.
*
Hoje tudo esta mudado
Veio a modernização,
Acabando com os costumes
Do nosso agreste sertão.
Acabando com a folia,
E com a nossa alegria
Enterrando a tradição.
*

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Viva São João! Viva Seu Mansueto!



Hoje, 23 de junho, dia de São João, é aniversário de Mansueto Silva, autor de "Minha Mala era um Pote" e, para meu orgulho e alegria, meu pai.

Quando lancei meu primeiro livro, em 2006, perguntaram-me se eu havia herdado o dom de escrever de alguém da família. Respondi que não, pois em minha família não havia escritores. 

Meses depois, quando estava perto de fazer 70 anos de idade, meu pai me entregou os manuscritos de "Minha Mala era um Pote", que na época ainda nem tinha título. Foi então que fiquei sabendo de quem eu tinha herdado o dom de escrever.

Hoje, Seu Mansueto já deu até palestra em faculdade, falando de seu livro e das coisas que são tratadas nele, como êxodo rural, ética e desigualdades sociais.

Mas isso é matéria para outra postagem. Hoje, quero apenas parabenizar o Velho Mansú por mais um ano de vida e sucesso. Acho que posso fazer isso em nome de toda a família e dos amigos, que são incontáveis.

Parabéns, Seu Mansueto!

LANTERNAS DE BARRO
Mansueto Silva
(Trecho do livro "Minha Mala era um Pote")

As primeiras recordações que me vêm sobre a minha infância são de uma vida dura no interior. Meus pais eram muito pobres, tinham muitos filhos e, naquela época, não havia serviço público de saúde para os pobres do interior. Não havia escolas, auxílio natalidade, nem tampouco abono familiar para os filhos dos trabalhadores. Assim, muitas necessidades, que hoje chamam de básicas, não eram atendidas.

Mas posso dizer que minha infância teve um começo parecido com a de outras crianças do lugar onde nasci: brincar o dia todo, todos os dias, até que chegasse a hora oportuna de ir ajudar meu pai na roça. Cheguei aos cinco anos de idade, e a única coisa que fazia era brincar e comparecer ao catecismo aos domingos. Quem ensinava era o seminarista Ademir, filho do Senhor Henrique Cesário, que era o dono da terra onde nós morávamos.

Foi a partir daí, dos cinco anos de idade, que a infância começou a terminar para mim. Meu pai acordava muito cedo e também acordava meu irmão, que era mais velho que eu, e nos levava para ajudar no trabalho da roça. Nessa hora, meu pai já havia feito aquele café grosso, adoçado com rapadura, e nós o tomávamos com um pedaço de “beiju xotão”, que a gente chamava de “beiju entala cachorro”. Depois dessa bela refeição, seguíamos para a roça, que ficava a uns quinhentos metros dali. Subíamos a aba da serra com todo o cuidado e íamos para o trabalho.

Quando chegávamos na roça, meu pai determinava o que devíamos fazer. Muitas vezes ele cavava grandes covas, para a plantação da mandioca, enquanto meu irmão cavava covas pequenas, para o milho e o feijão. Eu colocava as sementes nas covas e enterrava. Era um trabalho que começava pela manhã e ia até o meio dia. Quando a gente voltava para casa, verificava se nos forjos ou queixós  que armávamos havia sido apanhado algum preá, para ajudar no tempero do feijão. Às vezes a gente tinha sorte e havia alguma caça presa, mas outras vezes não havia nada. Aí o jeito era enfrentar o feijão com um pedaço de rapadura ou de peixe assado na brasa.

Era um trabalho duro para duas crianças de cinco e sete anos, como eu e meu irmão. Mesmo assim, depois do almoço tínhamos que voltar para a roça e continuar o trabalho até as seis horas da tarde. Quando voltávamos para casa, nossas pernas estavam marcadas pelas picadas de insetos. Mas a situação era aquela e não havia para quem apelar.

A verdade era que precisávamos enfrentar aquela luta todos os dias e, quando terminávamos de plantar as sementes, era o tempo de espantar os passarinhos, para não comerem o que havia sido plantado. Passávamos de oito a dez dias espantando os passarinhos, para que não arrancassem o milho. Às vezes eu andava pelo meio do roçado, com uma lata e um pedaço de pau na mão, batendo na lata para fazer barulho, afugentando os pássaros. Outras vezes, enquanto batia na lata, cantava alguns versos de poesia matuta, que eram conhecidos por todas as crianças que também espantavam os passarinhos das roças vizinhas:

Xô, passarinho
Do ôio dágua do pajé
Não coma meu milhinho
Que eu lhe dou quando tiver.

Foi mais ou menos por essa época, quando eu tinha por volta de cinco anos, que apareceram por ali as primeiras lanternas a pilha, hoje tão comuns. As lanternas eram as coisas mais interessantes que eu achava, principalmente as de três pilhas, que eram maiores e iluminavam mais. Eram também as mais caras. As pessoas passavam um bom tempo juntando dinheiro para comprar aquelas lanternas. Eu apenas sonhava em ter uma. Como não podia, tinha que me conformar em fazer as minhas próprias lanternas. Juntava um pouco de barro ligado, que chamávamos de “barro de louça”, e moldava o barro no formato da lanterna, deixando um buraco na frente, como se fosse o refletor. Na frente do buraco botava um pedaço de vidro, e na lateral fazia um buraco, por onde poderia passar um vaga-lume. Pegava os vaga-lumes e empurrava por aquele buraco. Assim o “refletor” ficava cheio de vaga-lumes. Naquela escuridão do interior, até parecia que havia alguma coisa acesa nas mãos dos meninos que brincavam com aquelas lanterninhas de barro.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Mais cordel no carnaval


VOA, PAVÃO MISTERIOSO!

Semana passada repliquei aqui postagem do blog ACORDA CORDEL, do meu amigo ARIEVALDO VIANA, sobre a adoção da Literatura de Cordel como enredo da Escola de Samba Salgueiro para o carnaval 2012.

Na postagem, Arievaldo expõe sua satisfação, por ver o cordel ocupando mais espaço na mídia, mas também sua preocupação com os efeitos negativos que essa difusão em larga escala pode ter sobre a própria Literatura de Cordel. 

O tema tem dado muito o que falar, gerando comentários de nomes de peso, como Marco Haurélio, Gilmar de Carvalho, Pedro Monteiro, Pedro Paulo Paulino e Rosário Pinto. Eu também dei meus pitacos, pois não sou de ficar em cima do muro.

Como acredito na importância do debate para a Literatura de Cordel, transcrevo, abaixo, as opiniões já manifestadas aqui neste Mundo Cordel e lá no ACORDA CORDEL também, para que o leitor vá formando a sua própria opinião. 

COMENTÁRIO DE ROSÁRIO PINTO EM MUNDO CORDEL:
Concordo com o Lobisomem: o fato de uma agremiação de escola de samba, do Rio de Janeiro, escolher com temática a literatura de cordel, é fato ÚNICO. Isto é motivo para comemoração e não para censuras. A literatura de cordel está em seu apogeu, o que faz com que possa ser apropriada por outras corretes da cultura popular e, se foi de forma espontânea, mais enriquecedor para a comunidaade de poetas de corderl. Afinal, a literatura de cordel chega ao palco universal da Marques de Sapucaí. Ao invés de ficármos nos colocando numa posição defensiva, devemos procurar subsidiar, para que o expetáculo fique ainda melhor e mais brilhante.

A verdadeira arte só é arte, quando pode ser referencial para todos, de todas as camadas sociais, raças, profissões e feitios. Não é à toa que que até os dias atuais os grandes escritores permanecem vivos e atuais e, nos tocam, nos referenciam e dizem de nossas emoções e vivências... O momento é de conquista, não de derrota. Se o samba não obedece os critérios de composição poética, não precisa - afinal, é samba-ennredo, com a temática da literatura de cordel, não ela própria. Vamos deixar o cordel embarcar nessa viagem misteriosa da Marques de Sapucai. Vamos deixá-lo voar e conquistar novos ares e novos terrenos... Quem sabe, daí sará o interesse formador de novos poetas que possam manter viva essa cultura literária que vem lá de idos tempos - passando de geração em geração e mantendo-se bela, homogenea e transcendente.
Beijos, amigos e confrades,

RESPOSTA DE MARCOS MAIRTON
Rosário,
esse é um assunto polêmico mesmo.
Já dei uma olhada nos comentários postados no blog do Arievaldo (Acorda Cordel) e vi que há manifestações diversas, inclusive a sua.
Em princípio, fico animado em ver que o cordel está conquistando tanto espaço, mas também tenho minhas preocupações.
Temo que aconteça ao cordel o que aconteceu com o forró, o qual está altamente difundido, mas já quase ninguém lembra o que ele é.
Por isso acho que, diante desse crescimento do cordel, está na hora de as pessoas interessadas na verdadeira Literatura de Cordel tomarem a iniciativa de realizar eventos, debates, seminários, programas de televisão.
Talvez o ideal fosse a ABLC puxar o cordão, mas, não conheço internamente a entidade, para avaliar se ela teria força para isso.
De qualquer forma, penso que qualquer movimento que se inicie nesse sentido sempre correrá o risco de sofrer com: a) a oposição de quem está satisfeito com a situação atual; e b) a infiltração de gente imediatista, que vai ver apenas alguma forma de ganhar algum dinheiro.
De qualquer maneira, acho que ficar parado é muito pior.
Acho que aqueles que se dedicam à Literatura de Cordel devem achar um jeito de ir às escolas, às universidades e à TV, trabalhando no sentido de que a Literatura de Cordel cresça, mas não desapareça, engolida (ou desfigurada) pela sua própria massificação. 

RESPOSTA DE ROSÁRIO PINTO
Mairton,

Partilho de suas preocupações, mas devemos pensar que temos poetas e pesquisadores suficientes para dar suporte a essas iniciativas. Já participei de muitas entrevistas em que procuro levar a fisionomia da literatura de cordel, com informações precisas e seguras. A ABLC e seu colegiado participam, com frequencia de documetários, entrevistas e outros eventos, sempre levando o debate para a mídia com informações abalizadas.

Ano passado a ABLC em parceiria com o CNFCP realizou o II Encontro de Poetas Populares e Rodas de Cantoria;
Apresentamos ao IPHAN, o pedido de Registro da literatura de cordel como Bem de Patrimônio Imaterial, que foi aceito. A próxima etapa será o preenchimento dos formulários e o levantamento das pesquisas para andar com o projeto. Nossa expectativa, na pesquisa, é a de ouvir, ouvir e ouvir os poetas e instituições de litetatura de cordel, nos principais estados de sua manifestação. A preocupação é também esta - a de não permitir desfiguração dessa forma de expressão popular, que atravessa séculos, pelo canal da oralidade, passando de geração em geração; acompanhando as tecnologias modernas, mas mantendo seus registros que, no Brasil, assumiu fisionomia própria.

E, penso que as escolas de samba são muito criteriosas, afinal, os desfiles e sambas-enredos, na Marques de Sapucai, tem o objetivo de conquistar prêmios. Existe gente muito séria envolvida nas pesquisas e a ABLC e o CNFCP estão disponiblizando seus acervos para consultas.


Precisamos deixar nosso PAVÃO MISTERIOSO VOAR! VOAR! VOAR!!!!

RESPOSTA DE MARCOS MAIRTON
Suas palavras são alentadoras, Rosário. Acho que estamos em sintonia.
Por aqui, vamos tentando ajudar em alguma coisa também. Afinal, é grande quantidade de sites e blogs relacionados à Literatura de Cordel, o que nos dá a responsabilidade de ajudar a cuidar dela.
Não posso encerrar sem manifestar meu reconhecimento a iniciativas como a das cirandas de cordel, promovidas por você e pela Dalinha, as quais, ao meu ver, fortalecem os laços entre os poetas e facilitam a comunicação entre eles.
Que o nosso PAVÃO MISTERIOSO voe, voe, voe!
Abraço!



Enquanto isso, no ACORDA CORDEL...

COMENTÁRIO DE MARCO HAURÉLIO:
É um caminho sem volta. Mas fico preocupado com a forma como o cordel é tratado. Se algum poeta foi chamado para dar consultoria, deve ser algum discípulo de Cuíca, pois mistura alhos e bugalhos, poesia matuta e cordel e, aqui e ali, derrapa feio na métrica.
Vale mais uma vez expor um trecho do livro Autores de Cordel, de Marlyse Meyer:
"De modo geral, os poetas procuram se informar de tudo. Leem, quando podem, e tentam possuir uma pequena biblioteca. É o caso de Manoel Camilo, possuidor de uma estante cheia de livros. É também característica do poeta popular uma verdadeira obsessão pelo aprimoramento da linguagem. Justamente por isto, não podem ser confundidos com os chamados poetas matutos, os quais deformam de propósito o idioma, com o intuito de recriar a linguagem do homem do campo, que acreditam errada." 

MANIFESTAÇÃO DE GILMAR DE CARVALHO, POSTADA POR ARIEVALDO:
Por e-mail, o professor Gilmar de Carvalho, estudioso da cultura popular nordestina, mandou-me esse comentário:

Prezado Arievaldo,
vamos começar pelo final: você tem razão, não podemos falar do que vai acontecer (Salgueiro, cordel, carnaval de 2012). Mas podemos falar do que está acontecendo agora.
Não vejo valorização do cordel. A telenovela que está no ar ("Cordel Encantado"), apesar de todos os cuidados de gaurda-roupa, cenografia, e do recurso à xilogravura na abertura, não tem muito a ver com o cordel. Seria melhor talvez intitulá-la de "Folhetim Encantado". Ela passa longe do encantamento produzido pelo cordel e insiste em todos os estereótipos que tanto abominamos.
A começar pelo sotaque "meio pernambucano / meio paraibano", como se fosse um a pizza encomendada para entrega em casa ("delivery"). O cordel é poesia da voz, ainda que impressa.
A telenovela quer impressionar pelo visual. Trata-se da mesma espetacularização pela qual passaram as quadrilhas juninas, os bois (Parintins), as festas de peão de boiadeiro (Barretos).
Muita cor, muito brilho e muita alegoria. Só isso. No caso da telenovela, uma luz irrepreensível, câmeras bem posicionadas, e uma edição de luxo. Um acabamento de primeira para disfarçar uma falta de consistência.
Na xilogravura da abertura, por exemplo, optou-se pela estilização, mais próxima da
utilizada pela publicidade: figuras soltas, recortadas, que não têm a ver com a incisão
na madeira, a perícia do corte e o esforço para se obter a expressão que é sofrida. Optou-se pelo pasteurizado, pelo Nordeste mais falso (ou fake).
Resumo da ópera: o cordel ainda espera por uma revisita que o atualize, que faça com que ele dialogue com a contemporaneidade. Para fazermos uma citação nostálgica: o cordel precisa ser lido como foi (com competência e sensibilidade) o auto "Morte e Vida Severina", do João Cabral de Melo Neto. Esta telenovela que está no ar parece mais uma diluição do universo de Ariano Suassuna, feita por que nunca leu cordel e pensa que o Nordeste é uma sucessão de clichês.
Ainda não foi desta vez.

Gilmar de Carvalho 

COMENTÁRIO DE PEDRO MONTEIRO:
O CORDEL tem seu espaço
Com todo o merecimento.
É poesia alinhavada
No crivo do pensamento,
Faz movimento constante,
É estrela cintilante
No alto do firmamento. 

COMENTÁRIO DE PEDRO PAULO PAULINO:
Sempre que o Sudeste se interessa pela arte que se faz no Nordeste, eu fico com a pulga na orelha: ou é por comiseração ou deturpação. Está escancarada essa verdade: a novela Cordel Encantado, de cordel só tem o nome. O modismo em torno do assunto é o mesmo que se produz em torno de tudo o que a Rede Globo mete goela abaixo no mau gosto popular. Tenho receios de que tantos paparicos com a Literatura de Cordel só contribuam para banalizar essa arte, mais do que já fizeram até agora os próprios pseudos cordelistas. Assim aconteceu com a própria MPB e uma de suas vertentes, o nosso forró. O que há hoje, em suma, é o cordel industrializado e manipulado a torto a direito em todos os quadrantes. Nunca se viu uma safra tão abundante de poetas populares, como agora. Eu mesmo não vejo nisso nada de promissor, perdoem-me o pessimismo. Grande parte dos "cordelistas" mete a mão na massa sem o menor escrúpulo, resultando quase sempre num produto final de péssima qualidade, pois não é todo dia que nasce um Zé Pacheco ou um Leandro Gomes de Barros. A Arte, no geral, não é respeitada no Brasil. Que o diga a Academia Brasileira de Letras, que acaba de outorgar a Medalha Machado de Assis a não sei quem jogador de bola. 

Eu e Rosário postamos nossos comentários feitos neste Mundo Cordel também no Acorda Cordel, mas acho que não é o caso de repetir aqui.

Bem, quem quiser acrescentar mais alguma coisa, o espaço está à disposição.

Por enquanto, fecho esta longa postagem inspirando-me no otimismo de Rosário Pinto, que já demonstrou que quer mesmo é ver nosso Pavão Misterioso voar. Então: 

- Voa, Pavão Misterioso!!!



domingo, 19 de junho de 2011

Cordel de Leandro Gomes de Barros


A SOGRA ENGANANDO O DIABO
Leandro Gomes de Barros

Dizem, não sei se é ditado,
Que ao diabo ninguém logra;
Porém vou contar o caso
Que se deu com minha sogra.
As testemunhas são eu,
Meu sogro, que já morreu,
E a velha, que é falecida.
Esse caso foi passado
Na rua do Pé Quebrado
Da vila Corpo Sem Vida.

Chamava-se Quebra-Quengo
A mãe de minha mulher,
Que se chamava Aluada
Da Silva Quebra-Colher,
Filha do Zé Cabeludo.
Irmã de Vítor Cascudo
E de Marcelino Brabo,
Pai de Corisco Estupor;
Mas ouça agora o senhor
Que fez a velha ao diabo.

Minha sogra era uma velha
Bem carola e rezadeira,
Tinha seu quengo lixado,
Era audaz e feiticeira;
Para ela tudo era tolo,
Porque ela dava bolo
No tipo mais estradeiro.
Era assim o seu serviço:
Ela virava o feitiço
Por cima do feiticeiro!

Disse o demo: — Quebra-Quengo,
Qual é a tua virtude?
Dizem que és azucrinada
E que a ti ninguém ilude?
Disse a velha: — Inda mais esta!
Você parece que é besta!
Que tem você c’o que faço?
Disse ele: — Tudo desmancho,
Nem Santo Antônio com gancho
Te livra hoje do meu laço!

Ela indagou: — Quem és tu?
Respondeu: — Sou o demônio,
Nem me espanto com milagre,
Nem com reza a Santo Antônio!
Pretendo entrar no teu couro!
E nisto ouviu-se um estouro!
Gritou a velha: — Jesus!
Ligeira se ajoelhou
E, depois, se persignou
E rezou o Credo em cruz!

Nisto, o diabo fugiu.
E, quando a velha se ergueu,
Ele chegou de mansinho,
Dizendo logo: — Sou eu!
Agora sou teu amigo
Quero andar junto contigo,
Mostrar-te que sou fiel.
Minha carta, queres ver?
A velha pediu pra ler
E apossou-se do papel.

— Dê-me isto! grita o diabo,
Em tom de quem sofre agravo.
Diz a velha: — Não dou mais!
Tu, agora, és o meu escravo!
Disse o diabo: — Danada!
Meteu-me numa quengada!
Sou agora escravo dela!
E disse com humildade:
— Dê-me a minha liberdade,
Que esticarei a canela!

Disse a velha: — Pé de pato,
Farás o que te mandar?
Respondeu: — Pois sim, senhora,
Pode me determinar,
Porque estou no seu cabresto
Carregarei água em cesto,
Transformarei terra em massa,
Que para isso tenho estudo;
Afinal, eu farei tudo
Que a senhora disser — faça!

Disse a velha: — Vá na igreja,
Traga a imagem de Jesus.
Respondeu: — Posso trazê-la,
Mas ela vem sem a cruz,
Porque desta tenho medo!
Disse a velha: — Volte cedo!
Ele seguiu a viagem
E ao sacristão iludiu:
Uma estampa lhe pediu
Que só tivesse uma imagem.

A velha, então, conheceu
Do cão o quengo moderno,
E, receando que um dia
A levasse para o inferno,
Para algum canto o mandou
E em sua ausência traçou
Com giz uma cruz na porta.
Voltou o cão sem demora,
Viu a cruz, ficou de fora,
Gritando com a cara torta.

Gritou o cão no terreiro:
— Aqui não posso passar!
Venha me dar minha carta,
Quero pro inferno voltar!
Disse a velha que não dava,
Mas ele continuava
A rinchar como uma besta.
— Pois fecha os olhos! ela diz.
Ele fechou e, com giz,
Fez-lhe outra cruz bem na testa!

Aí entregou-lhe a carta
E o demo pôs-se na estrada,
Dizendo com seus botões:
— Não quero mais caçoada
Com velha que seja sogra,
Porque ela sempre nos logra!
Foi, assim, a murmurar.
Quando no inferno chegou,
O maioral lhe gritou:
— Aqui não podes entrar!

— Então, já não me conhece?
Perguntou ao maioral.
— Conheço, porém, aqui
Não entras com tal sinal:
Estás com uma cruz na testa!
Disse ele: — Que história é esta?
Que é que estás aí dizendo?
Mirou-se dum espelho à luz:
Quando distinguiu a cruz,
Saiu danado, correndo!

E, na carreira em que ia,
Precipitou-se no abismo,
Perdeu o ser diabólico,
Virou-se no caiporismo,
Pela terra se espalhou,
Em todo lugar se achou,
Ao caipora encaiporando,
Embaraçando seus passos
E com traiçoeiros laços
As sogras auxiliando…

Deste fato as testemunhas
Já disse todas quais são.
Agora, quer o senhor
Saber se é exato ou não?
Invoque no espiritismo
Ou pergunte ao caiporismo,
Este que sempre nos logra,
Se sua origem não veio
Do diabo imundo e feio
E do quengo duma sogra!

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Cordel no Carnaval Carioca


DEPOIS DA TV, CORDEL GANHA
MARQUÊS DE SAPUCAÍ


Dizem que no Brasil, tudo acaba em samba... Acabava! Agora acaba tudo em cordel. 90% dos encartes de lojas que circularam agora em junho aqui em Fortaleza usaram a gravura popular (de capas de folhetos) como principal ilustração. Até anuncios da TV seguiram a mesma trilha. É sempre bom ver a cultura nordestina em destaque, sendo reconhecida em outros recantos do país.

Depois que a Rede Globo lançou a novela Cordel Encantado é a vez de uma grande escola de samba do Rio de Janeiro (a Acadêmicos do Salgueiro) aproveitar o tema para o desfile de 2012. No entanto, essa badalação enorme que se criou em torno da Literatura de Cordel às vezes me anima e às vezes me preocupa. Para quem lê cordel desde a infância e conhece essa arte como a palma da mão, tais manifestações às vezes soam falsas e meio pasteurizadas. A intenção pode ser boa, mas o cordel com a sinopse do tema, que irá inspirar os compositores para composição do samba enredo da Acadêmicos do Salgueiro  mistura, equivocadamente, o linguagajar matuto (que não é utilizado pelo verdadeiro cordelista) com métrica claudicante e rimas duvidosas. É uma simbiose de Patativa do Assaré com o samba do crioulo doido. Passa é longe da arte de José Camelo de Melo, Leandro Gomes de Barros e José Pacheco da Rocha. Quantas vezes vou ter ainda que repertir que CORDEL é uma coisa e POESIA MATUTA é outra?

Sinceramente,  versos como "um cadim de inspiração" doem no ouvido. E TROVA rimando com EUROPA é de fazer o velho Manoel D'Almeida Filho se remexer na tumba! Outra coisa, ví xilogravuras de J. Borges, Costa Leite, Dila e outros artistas compondo o cenário (que por sinal está belíssimo)... Será que esses artistas populares nordestinos receberam alguma coisa de direito autoral? Afinal de contas, o carnaval carioca é um negócio altamente lucrativo, que movimenta cifras astronômicas. Não custa nada deixar uma moedinha cair na cuia do ceguinho cantador de feira, não é mesmo?

Os mais otimistas dizem que o cordel está ganhando projeção nacional, que será absorvido e digerido avidamente por todas as camadas sociais e por gente dos mais distantes rincões desse país continental. Os tradicionalistas vêm esse oba-oba com desconfiança, uma vez que o que vem sendo apresentado até aqui não passa de uma caricatura da poesia popular, com foco mais centrado na xilogravura. Fala-se muito que o cordel está em evidência graças à novela e outras manifestações afins, mas na prática, no frigir dos ovos, o que isto vem trazendo de positivo para o poeta popular? Que custo era contratar especialistas no assunto para uma consultoria?

Eu, particularmente, não quero cometer o pecado julgar por antecipação o espetáculo que a Acadêmicos do Salgueiro prepara para o carnaval de 2012. Até porque, a ABLC (Academia Brasileira de Literatura de Cordel), instituição da qual faço parte, será homenageada pela referida Escola de Samba... De repente, pode vir coisa boa por aí, mas pelo sim, pelo não, estou com as barbas de molho.

Vejam, a seguir, matéria extraida do blog "Quintal do Lobisomem", mantido pelo poeta Victor Alvim, capoeirista famoso no Rio de Janeiro, autor de diversos folhetos
:


A tradicional escola de samba Acadêmicos do Salgueiro acertou em cheio ao escolher o tema do seu próximo carnaval. A vermelha e branca tijucana vai levar para a avenida o enredo "Cordel Branco e Encarnado", de autoria de Renato Lage e Márcia Lage.

A escola pretende unir a arte dos poetas populares do Nordeste com o inconfundível batuque carioca. Sem esquecer das origens do cordel na Europa , que ressurgiu com toda a força no Nordeste em histórias que caíram no gosto popular, como "O Romance do Pavão Misterioso", obra que inspirou os carnavalescos a criarem a logomarca do enredo salgueirense.

A sinopse do enredo foi apresentada aos compositores no dia 14 de junho em reunião na quadra da Rua Silva Teles e surpreendeu a todos por ter sido escrita em forma de poema como um tradicional cordel. Tive a oportunidade de estar presente trocando informações com o carnavalesco Renato Lage, a diretoria cultural e parte da sua talentosa equipe, entre eles Gustavo Mello, Eduardo Pinto, Dudu Azevedo e Luciane Malaquias.

Como poeta popular, cordelista e membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel gostaria de parabenizar a Acadêmicos do Salgueiro por escolher um enredo que verdadeiramente aborde uma das maiores riquezas da nossa cultura popular brasileira.
 

E uma bela parceria está se iniciando entre estas duas academias: a do samba e a da literatura de cordel.
 

Confiram abaixo a sinopse na íntegra:


Salgueiro 2012
(Cheio de poesia, imaginação e encantamento)

Minha "fia", meu senhor
Deixa eu me apresentar
Sou poeta e meu valor
Vai na avenida passar
Basta imaginação
Um "cadim" de inspiração
Que eu começo a versar

Vou cantar a minha arte
Que nasceu bem lá distante
Num lugar que hoje é parte
Da nossa origem errante
Vim das bandas da Europa
Nas feiras, a boa trova
Era demais importante!

Foi assim que o mar cruzei
Na barca da encantaria
Chegou por aqui um Rei
Com bravura e poesia
Carlos Magno e o os doze pares
Desfilando pelos mares
Da mais real fidalguia

E veio toda a nobreza
Que um dia eu imaginei
Rainha, duque, princesa
E até quem eu não chamei:
Um medonho de um dragão
Irreal assombração
Dessa corte que eu sonhei

Também tem causo famoso
Que nasceu lá no Oriente
De um tal misterioso
Pavão alado imponente
Que cruza o céu de relance
Dois jovens, e um só romance
Vencendo o Conde inclemente

Todas essas histórias
Renasceram no sertão
Onde vive na memória
O eterno Lampião
E não houve um brasileiro
Que de Antônio Conselheiro
Não tivesse informação

Pra viajar no meu verso
É preciso ter "corage"
Vai que um bicho perverso
Surge que nem "visage"?
Nas matas sertão afora
Lobisomem, caipora
Que medo dessas "image"!!

Pra findar esse rebuliço
Rezar é a solução!
Valei-me meu "padim" Ciço!
Vá de retro, tentação!
Nossa Senhora eu não quero
(Tô sendo muito sincero)
Cair nas garras do cão!

E não é que meu santo é forte?
Cheguei ao céu divinal
É tamanha a minha sorte
A minha vitória afinal
É cantar com alegria
Fazer verso todo dia
Na terra do carnaval

Ao ver chegar a tal hora
Da minha "alegre" partida
Saudade, palavra agora
Tem posição garantida
Mas não se avexe meu irmão
Que hoje a coroação
Acontece é na avenida

Pois eles hão de herdar
Todo esse sertão sonhado
Monarcas que vão reinar
Na corte do Sol dourado
Poetas de tradição
Recebam de coração
Um cordel Branco e Encarnado

E agora eu vou sem medo
Fazer festa "de repente"
Vai nascer um samba-enredo
Pra animar toda a gente
Afinal, não sou melhor
Muito menos sou pior
Só um poeta diferente!


Renato Lage, Márcia Lage, Departamento Cultural

Fotos: Vicente Almeida e Gustavo Mello
Saiba mais notícias sobre a literatura de cordel no carnaval do Salgueirono site: www.carnavalesco.com.br

Livro de Carlos Santos - Lançamento




SÓ RINDO 2: A política do bom humor do palanque aos bastidores

Repasso convite do meu amigo Carlos Santos, de Mossoró:

Você é meu convidado.

Falo sobretudo ao mais anônimo e humilde dos internautas, que acessa esta página com regularidade ou ocasionalmente. Não importa.

No próximo dia 21 (terça-feira), à próxima semana, às 19h30, nos jardins da TV Cabo Mossoró, estarei lançando meu segundo livro.

É outro filhote querido, concebido com enorme dificuldade; amado.
O “Só Rindo 2 – A política do bom humor do palanque aos bastidores” é uma coletânea de situações hilariantes, que envolvem políticos e outras figuras que formam esse universo.

A intenção não é promover o escárnio ou a ridicularização. Como o primeiro livro, esse mostra um “lado B” menos tortuoso da atividade política. Humanizado.

Aguardo-o por lá.

Seja bem-vindo.



segunda-feira, 13 de junho de 2011

Poesia de Dalinha Catunda


QUADRILHA
Dalinha Catunda
 
Maria bonita
vestida de chita
dançava São João.
Em meio a quadrilha,
seguia a trilha
do seu coração.
Coração aventureiro
gostava de Pedro,
e queria João.
João tava difícil,
não foi sacrifício
pegar noutra mão
Viva S. Pedro!
Viva S. João!
Maria era bonita!
E com laço de fita
virou perdição.
Com cabelos trançados,
e seu requebrado,
chamava atenção.
Dançando faceira
esqueceu-se de Pedro,
e também de João.
Nos braços de Antônio
perdeu-se nos sonhos,
ardeu-se em paixão.
Foi aí que Maria
perdeu sua fita
rolando no chão.
Maria aflita
sem laço de fita
engrossou a cintura
e fugiu do sertão

--

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Décimas de Paulo Barja


LEITURA É DIVERSÃO E APRENDIZADO
Paulo R. Barja (paulobarja@ig.com.br)

Eu leio o que estiver à minha frente:
cartaz, bula, HQ, cordel, jornal,
revista, placa, livro... isso é normal
- leitura é coisa boa, minha gente!
Quem lê fica melhor, inteligente,
e eu fui, desde pequeno, incentivado;
cresci como leitor apaixonado
e a vida me ensinou mais de uma vez
(escutem bem o que eu digo a vocês):
Leitura é diversão e aprendizado.

Criança pode ler desde pequena:
um livro também fala por figura
e, folheando com desenvoltura,
sozinha ela vai lendo, assim, serena...
Também gosto demais de ver a cena
da mãe lendo pro filho ali deitado,
na hora de dormir, tão fascinado
com uma história boa que se conta.
Aí vejo a verdade que desponta:
Leitura é diversão e aprendizado.

Agora, uma pergunta eu vou fazer
e quero ver quem sabe me contar:
como é que um cego pode se expressar
em texto escrito? Quem sabe dizer?
Um jovem lá na França fez valer
seu raciocínio privilegiado
e ”Braille” foi o código inventado
- foi mesmo uma conquista muito boa.
Por isso digo pra qualquer pessoa:
Leitura é diversão e aprendizado.

Às vezes, é legal ler em voz alta
um texto que se adora... sabe quando?
Em roda ou num sarau, compartilhando
poesia como o solo de uma flauta.
A música, aliás, tem uma pauta:
é onde o canto fica registrado
e, se o compositor for inspirado,
pra sempre cantarão a sua escrita.
Partindo disso, pense bem, reflita:
Leitura é diversão e aprendizado.


Grande abraço, e viva a literatura de cordel!

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