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sexta-feira, 3 de junho de 2011

Cordel de Marconi Araújo


O CANGAÇO E SEU SIGNIFICADO
Marconi Pereira de Araújo (*)

(1)
Contarei uma passagem
Nas linhas que agora traço
Lá do século dezenove
Veja agora o passo a passo
Não é mera brincadeira
É história verdadeira
Daquilo que é cangaço

(2)
Este nome vem de canga
Peça de madeira usada
Pra prender o velho boi
Naquela época passada
Em carro assim, de transporte
Para o sul ou para o norte
De carga leve ou pesada

(3)
Falo de carro de boi
Que sempre foi importante
Ô bicho bom, resistente
Tão forte e até elegante
De tão grande utilidade
Ele exerceu na verdade
Um papel preponderante

(4)
Mas cangaço meu leitor
Quem avisa amigo é
É algo bem mais profundo
Que lembra bandido até
Crime e ação violenta
Fuga rápida e também lenta
Seqüestro de coroné

(5)
Tudo nasceu no nordeste
Na região sertaneja
Grupo armado visava
Fazer valer a peleja
De impor sua própria vontade
O Império sem lei, na verdade
Do jeito que fosse seja

(6)
Os cangaceiros assim chamados
Recebiam fiel proteção
De coronéis a representar
Grupos políticos da região
Sua ação foi facilitada
Pela reação fracassada
E o isolamento do sertão

(7)
A gana assassina dos bandos
Nem se pode imaginar
Teve aceitação veemente
Tanto apoio popular
Por fato dito tão nobre
Roubo de rico pra pobre
Fez cangaço mais reinar

(8)
É o que acontece agora
Nos tempos tão atuais
Onde favelas e morros
Têm gangs e maiorais
Que protegem os moradores
Mas que cometem horrores
Fuzilando e tudo mais

(9)
O maior representante
Do grande império sem lei
Era o Senhor do Sertão
Que do Cangaço era Rei
Chupando manga era o cão
Se chamava Lampião
Se tu não sabes eu sei!

(10)
Cabra da peste e bruto
Ele era assim retratado
Para outros porém todavia
Era digno, um herói arretado
Por luta glória ou inglória
Sua intrigante história
É fato tão estudado

 (11)
Virgulino Ferreira da Silva:
O nome de Lampião
Homem pernambucano
O cangaceiro de então
Invadia fazendas, cidades
E cometia atrocidades
Era o terror do sertão

(12)
Levava dinheiro e jóias
E tudo enfim de valor
Depois dividia o roubo
E agia com rigor
Um espetáculo à parte
Bem mais que obra de arte
Do banditismo era ator

(13)
No bando de Lampião
Não havia preconceito
Tinha também mulher
Atuando de seu jeito
Maria Bonita em ação
Assaltou até coração
Pra elevar seu conceito

(14)
Casou-se com Lampião
Dá pra prever o babado
Uma filha desse amor
Provocando batizado
Vinda de dois cangaceiros
Casal vinte de guerreiros
Foi para o bando um achado

(15)
Dezoito anos do cangaço
De Lampião foi bastante
Pra mostrar a sua força
E o quanto foi atuante
Ele roubou, enriqueceu
E por emboscada morreu
Em data assim bem marcante

(16)
Mil novecentos e trinta e oito
Final de julho se fez
Cessar enfim o cangaço
Vinte e oito do mês
Entendi agora o compasso
E tão bem o passo a passo
Basta contar até três

(17)
Ficou fácil então entender
O cangaço realmente
Com o linguajar do povo
De modo assim envolvente
Concluo e o faço agora
Pois sei que é chegada a hora
De ir e seguir em frente

(18)
Quem prestou atenção percebeu
Cangaço: marco importante
História de nossa gente
Papel tão relevante
Para a região do nordeste
Lampião o cabra da peste
Foi símbolo mais que marcante



(*) O poeta é servidor da Justiça Federal há 21 anos, exercendo atualmente as funções de Diretor de Secretaria da 10ª Vara Federal em Campina Grande/PB. Há alguns anos vem desenvolvendo trabalhos em formato de cordel, tendo sido premiado em 2003 pela Justiça Federal na Paraíba, quando do 1º Concurso de Literatura de Cordel promovido por aquela Instituição, ocasião em que apresentou sua obra sob o título “Justiça Federal fazendo História”.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Martelo de Vitor "Lobisomem"


SENTIMENTO CANGACEIRO

Corre em mim um sangue de CANGACEIRO
E carrego um brilho de LAMPIÃO
Que reflete no aço de um facão
Meu espírito forte e guerreiro
Tenho DEUS como sagrado coiteiro
Pra enfrentar as volantes da maldade
Mentira, traição e falsidade
Me trouxeram angústia e rebeldia
Quando vejo injustiça e covardia
Me desperta a impulsividade


Meu instinto animal se faz presente
Ferindo muito mais do que um punhal
Mas procuro guardar em meu bornal
Alegria e bondade simplesmente
Pontear a viola do repente
Com estrofes de amor e esperança
Pra cantar o xaxado da bonança
E encontrar minha Maria Bonita
Pois a estrada da vida é infinita
E nela cangaceiro não descansa


Trago no peito a minha cartucheira
De carinho e amor bem carregada
Para quando encontrar a minha amada
Minha Maria Bonita cangaceira
Vou fazer rainha a mulher rendeira
E viver nossa vida a namorar
Só a ela que eu vou desejar
De respeito entre nós seremos ricos
E perder a cabeça em nossa Angicos
Só se for de prazer ao te amar. 

terça-feira, 8 de junho de 2010

Cordel de Guaipuan Vieira


Esse eu fui buscar lá na coluna "Repentes, motes e glosas", de Pedro Fernando Malta, no Jornal da Besta Fubana. Eu já conhecia há muito tempo a "Chegada de Lampião no Inferno", mas a chegada do cangaceiro no céu foi para mim uma novidade.

A chegada de Lampião no Céu
Guaipuan Vieira
Foi numa Semana Santa
Tava o céu em oração
São Pedro estava na porta
Refazendo anotação
Daqueles santos faltosos
Quando chegou Lampião.


Pedro pulou da cadeira
Do susto que recebeu
Puxou as cordas do sino
Bem forte nele bateu
Uma legião de santos
Ao seu lado apareceu.


São Jorge chegou na frente
Com sua lança afiada
Lampião baixou os óculos
Vendo aquilo deu risada
Pedro disse: Jorge expulse
Ele da santa morada..


E tocou Jorge a corneta
Chamando sua guarnição
Numa corrente de força
Cada santo em oração
Pra que o santo Pai Celeste
Não ouvisse a confusão.


O pelotão apressado
Ligeiro marcou presença
Pedro disse a Lampião:
Eu lhe peço com licença
Saia já da porta santa
Ou haverá desavença.


Lampião lhe respondeu:
Mas que santo é o senhor?
Não aprendeu com Jesus
Excluir ódio e rancor?…
Trago paz nesta missão
Não precisa ter temor.


Disse Pedro isso é blasfêmia
É bastante astucioso
Pistoleiro e cangaceiro
Esse povo é impiedoso
Não ganharão o perdão
Do santo Pai Poderoso


Inda mais tem sua má fama
Vez por outra comentada
Quando há um julgamento
Duma alma tão penada
Porque fora violenta
Em sua vida é baseada.


- Sei que sou um pecador
O meu erro reconheço
Mas eu vivo injustiçado
Um julgamento eu mereço
Pra sanar as injustiças
Que só me causam tropeço.


Mas isso não faz sentido
Falou São Pedro irritado
Por uma tribuna livre
Você aqui foi julgado
E o nosso Onipotente
Deu seu caso encerrado.


- Como fazem julgamento
Sem o réu estar presente?
Sem ouvir sua defesa?
Isso é muito deprimente
Você Pedro está mentindo
Disso nunca esteve ausente.


Sobre o batente da porta
Pedro bateu seu cajado
De raiva deu um suspiro
E falou muito exaltado:
Te excomungo Virgulino
Cangaceiro endiabrado.


Houve um grande rebuliço
Naquele exato momento
São Jorge e seus guerreiros
Cada qual mais violento
Gritaram pega o jagunço
Ele aqui não tem talento.


Lampião vendo o afronto
Naquela santa morada
Disse: Deus não está sabendo
Do que há na santarada
Bateu mão no velho rifle
Deu pra cima uma rajada.


O pipocado de bala
Vomitado pelo cano
Clareou toda a fachada
Do reino do Soberano
A guarnição assombrada
Fez Pedro mudar de plano.


Em um quarto bem acústico
Nosso Senhor repousava
O silêncio era profundo
Que nada estranho notava
Sem dúvida o Pai Celeste
Um cansaço demonstrava.


Pedro já desesperado
Ligeiro chamou São João
Lhe disse sobressaltado:
Vá chamar Cícero Romão
Pra acalmar seu afilhado
Que só causa confusão.


Resmungando bem baixinho
Pra raiva poder conter
Falou para Santo Antônio:
Não posso compreender
Este padre não é santo
O que aqui veio fazer?!


Disse Antônio: fale baixo
De José é convidado
Ele aqui ganhou adeptos
Por ser um padre adorado
No Nordeste brasileiro
Onde é “santificado”.


Padre Cícero experiente
Recolheu-se ao aposento
Fingindo não saber nada
Um plano traçava atento
Pra salvar seu afilhado
Daquele acontecimento.


Logo João bateu na porta
Lhe transmitindo o recado
Cícero disse: vá na frente
Fique despreocupado
Diga a Pedro que se acalme
Isso já será sanado.


Alguns minutos o padre
Com uma Bíblia na mão
Ao ver Pedro lhe indagou:
O que há para aflição?
Quem lá fora tenta entrar
E também um ser cristão.


São Pedro disse: absurdo
Que terminou de falar
Mas Cícero foi taxativo:
Vim a confusão sanar
Só escute o réu primeiro
Antes de você julgar.


Não precisa ele entrar
Nesta sagrada mansão
O receba na guarita
Onde fica a guarnição
Com certeza há muitos anos
Nos busca aproximação.


Vou abrir esta exceção
Falou Pedro insatisfeito
O nosso reino sagrado
Merece muito respeito
Virou-se para São Paulo:
Vá buscar este sujeito.


Lampião tirou o chapéu
Descalço também ficou
Avistando o seu padrinho
Aos seus pés se ajoelhou
O encontro foi marcante
De emoção Pedro chorou.


Ao ver Pedro transformado
Levantou-se e foi dizendo:
Sou um homem injustiçado
E por isso estou sofrendo
Circula em torno de mim
Só mesmo o lado ruim
Como herói não estão me vendo.


Sou o Capitão Virgulino
Guerrilheiro do sertão
Defendi o nordestino
Da mais terrível aflição
Por culpa duma polícia
Que promovia malícia
Extorquindo o cidadão.


Por um cruel fazendeiro
Foi meu pai assassinado
Tomaram dele o dinheiro
De duro serviço honrado
Ao vingar a sua morte
O destino em má sorte
Da “lei” me fez um soldado.


Mas o que devo a visita
Pedro fez indagação
Lampião sem bater vista:
Vê padim Ciço Romão
Pra antes do ano novo
Mandar chuva pro meu povo
Você só manda trovão.


Pedro disse: é malcriado
Nem o diabo lhe aceitou
Saia já seu excomungado
Sua hora já esgotou
Volte lá pro seu Nordeste
Que só o cabra da peste
Com você se acostumou.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Jessier Quirino



RASGA RABO BAGUNÇADOR DE BAGUNÇA


Copiei essa do Jornal da Besta Fubana (
www.luizberto.com), da coluna “De cumpade pra cumpade”, do mestre Jessier Quirino. Já conhecia de seu livro/CD “Bandeira Nordestina”. Fantástico!


Trupizupe oia tu num me assusta
Com a fama da tua valentia
Porque esta macheza é freguesia
E até nem me parece tão robusta
Uma boa palmada não me custa
Pois no fundo eu te acho delicado
Se tu és um valente escolado
Eu quebrei no cacete a tua escola
O teu mestre saiu de padiola
E teu supervisor invertebrado.

No jardim da infância eu fui valente
E o nome da escola era bufete
No primário estudei no canivete
No ginásio no bote de serpente
Como eu era um aluno inteligente
Logo cedo já tinha me formado
Lampião tinha sido reprovado
Por froxura e por falta de frieza
Hoje, pós-graduado em malvadeza,
Vendo pena de morte no mercado.

Eu sou topada de unha encravada
Sou gilete no mei do tobogã
Sou o flagra da foda no divã
Sou feiúra dum talho de inchada
Sou um choque no furo da tomada
Sou ferrugem na agulha de injeção
Sou judeu se vingando de alemão
Cata-vento voando num comício
Sou a falta de droga num hospício
Queimadura de larva de vulcão.

Sou rolo compressor desgovernado
Libanês dirigindo um carro-bomba
Sou uns 300 quilos de maromba
Despencando do braço levantado
Sou carrasco esperando um condenado
Sou a queda fatal da guilhotina
Metralhada cruel de uma chacina
Marretada no dedo polegar
Eu sou o fósforo acesso pra fumar
Que explodiu o tambor de gasolina.

Eu sou a folha perversa da urtiga
Despontando no vaso sanitário
Querosene na mão do incendiário
Solitária mexendo na barriga
Sou machado afiado numa briga
Sou o chifre botado em Romeu
Sou Menguele com raiva de judeu
Sou o tiro certeiro do arpão
Sou a aids injetada no machão
Que enlouquece jurando que não deu.

Eu sou navalha na mão de delinquente
Jacaré triturando um caçador
Tirotei dentro dum elevador
Araldite numa escova de dente
Eu sou ninho de cobra num acidente
Sou ladrão seqüestrando um delegado
Comeine depois do atentado
Sou 500 mil watts de energia
Sou tesoura cruel de cirurgia
Que ficou na barriga do operado.

Eu sou o estouro brutal de uma boiada
Sou a fúria de um tubarão faminto
Cão de guarda trancado num recinto
Sou três tapas depois de uma facada
Eu sou rinoceronte em disparada
Explosão de usina nuclear
Sou mudança que cai do décimo andar
Sou o corte inflamado do punhal
Cianureto maior que sonrrisal
Que o nazista obrigou a mastigar.

Eu sou o maior beliscão do alicate
Maçarico cortando gente ruim
Tiro ao alvo na cara de Delfim
Criolina na sopa de tomate
Eu sou o pênalti perdido num empate
Sou scania sem frei na contramão
Gente besta coberto de razão
Matador disfarçado de molengo
Sou torcida irada do Flamengo
Perseguindo o juiz que foi ladrão.

Eu sou a explosão de foquete iraniano
Que subiu carregado de safado
Sou negrada invadindo o senado
Dando o golpe em galego africano
Peixerada de paraibano
Sou mijada na cara do doutor
Instrumento de esquartejador
Sou engasgo com bola de sinuca
Eu sou o tiro certeiro de bazuca
Que matou o infeliz do ditador

Trupizupe prepara a tua cova
É chegado o dia da decisão
Vai fazer tua última comunhão
Pois eu já preparei a tua prova
De arame farpado vai ter sova
Vai lembrando do teu aprendizado
Pois eu já tô ficando endiabrado
Só de raiva já dei um saculejo
Dei até beliscão num azulejo
Mas ainda não tô mal-humorado.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Cangaço


POESIA CANGACEIRA

Outra valiosa contribuição que recebi durante as férias foram as poesias de Sandro Kretus, que vieram em forma de comentário. Uma delas é essa:

CODINOME LAMPIÃO

O meu nome é Virgulino
O lagarto nordestino
Ouça bem o que lhe digo
O cangaço é meu quintal
Meu sobrenome é perigo
Vai logo me dando essas moedas
Vai logo rezando á padre Ciço

Foi com Antônio e Levino
Com meus irmãos eu aprendi
Que no cangaço o homem
Tem que ser macho
No cangaço o homem
Não pode dormir


Leão valente e cangaceiro
Macho de todas as maneiras
Foi assim que eu me apresentei
Na tropa do sinhô Pereira

Vendo o sofrimento de meu povo
Nas mãos do crime eu cai
Na casa da baronesa
De água branca eu bebi

Peguei o bicho pelo pescoço
Prendi Antônio Gurgel
Um frio na espinha desceu pelas costas
Me gelando a boca do céu

Numa agonia de dá dó
Foi dois de uma vez só
Perdi Colchete e Jararaca
Na invasão á Mossoró

O calango escondido
Não aceitou a derrota
Mas tive que esperar
Pois Pernambuco, Paraíba
E Ceará, estavam á me caçar

Atravessei o São Francisco
Com cinco cabras na mão
E foi lá na Bahia
Que eu me levantei do chão

Um certo dia escondido
Na fazenda de um coiteiro
Foi lá que eu encontrei
Meu amor verdadeiro

Só tinha um problema
Era a mulher do sapateiro

Fugiu comigo em nome desse amor
Enchendo meu coração de alegria
Maria Déia, cheia de idéia
Flor nordestina

Na caatinga
Debaixo de um umbuzeiro
Nasceu minha filha Expedita
Lindo anjo vindo do céu
Á iluminar minha vida

Com minhas roupas de Napoleão
Feitas pelas minhas mãos de artesão
Apresentei meu bando e minhas cartucheiras
Ás lentes de Abrão

O meu olho que vazava
Dr: Bragança arrancou
Confesso tive medo
Mas não senti nenhuma dor

Meu destino tava chegando
Senti meu peito sangrar
João Bezerra e Aniceto Rodrigues
Vieram me atocaia

Vi cai Quinta-feira
Vi cai Mergulhão
Vi cai Enedina
De joelho no chão

Vi Moeda e Alecrim
No rabo do foguete
Vi cai Macela
Vi cai Colchete

Antes de dar meu último suspiro
Pensei no meu amor
Onde tá Maria Bonita?
Minha amada
Minha flor

Fui Virgulino Ferreira da Silva
Codinome Lampião
Vivi, amei, e morri
Nos braços do Sertão.

Sandro Kretus
O andarilho da terra do fogo

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Cordel e celebridades (Sávio Pinheiro)



"O ARRANCA-RABO DE YOKO ONO COM MARIA BONITA"
OU "A DESANVENTURA DE JOHN LENNON E LAMPIÃO"
Autor: Sávio Pinheiro, médico e cordelista natural de Várzea Alegre-CE, que, segundo notícia do Jornal A Praça, de Iguatu, de 25.08.2007, "vem usando a literatura de Cordel para divulgar seus projetos na área de Saúde da Família e por conta disso já ganhou vários prêmios nesta área em todo o Brasil". Quem enviou o material foi meu amigo e colaborador Ricardo Piau, varzealegranse dos bons, morando no Juazeiro do Norte do meu Padim Ciço.

No mundo, ao qual habitamos,
As injustiças imperam
As guerras se multiplicam
As vidas se desoneram
E sem justiça social
Os povos se desesperam.

No século, que se passou
Houve muita tirania,
Assisti guerras horrendas,
Multidões em agonia,
Porém, a paz almejada
Não saiu da fantasia.

O tempo assim vai passando...
A esperança também!
A insegurança aumentando
Não tem pena de ninguém
E a tão sonhada igualdade
Voa alto... Muito além!

Nesse cenário esquisito
Observo sempre, atento,
O pensamento reinante
Do povo em movimento
E um caso interessante
Narro aqui, nesse momento.

Certo dia de domingo,
Num plantão no hospital,
Atendi a um paciente,
Que em sua casa passou mal,
Tendo um quadro de delírio
Quase sobrenatural.

Narrativa de valor
Chamou a todos à atenção:
Um homem muito educado
De bem traçada feição
Após grande bebedeira
Pôs a mente em confusão.

Um episódio delirante
Após parar de beber
Fez-lhe bastante agitado
Sem vontade de viver
Porém, ao ser medicado
Filosofou com prazer:
- Eu sempre fui defensor
Da justiça social
E eterno incentivador
Da concórdia universal,
Daí, nutrir grande crença
De ver a paz mundial.

Enquanto o homem sonhava
O seu olhar foi pro teto
Vislumbrou grandes besouros
Sob a laje de concreto
E delirando, de fato,
Foi falando bem direto:

- Silêncio! Peço silêncio!
Pois assisto a uma visão:
Vejo uma mulher brigando
Xingando uma outra, então,
É a esposa de John Lennon
Com a mulher de Lampião.

Yoko:
Quem você pensa que é
Cangaceirinha atrevida
Pra falar mal do meu Lennon,
Que defendeu sempre a vida,
Você tem é muita inveja
Por ser tão desprotegida.

Maria:
Não me sinto garantida
Nesse mundo injustiçado,
Onde o rico oprime o pobre
Com plano já bem traçado;
Pois se o Lennon quis a paz
Não chegou no meu roçado.

Yoko:
Um planeta abençoado
Foi o que Lennon mais pediu.
Criticando sempre as guerras,
Da violência, fugiu,
Não concretizando o sonho
Do nosso mundo partiu.

Maria:
Sei o quanto ele insistiu
Nessa determinação
E que utilizou o rock
Com bastante precisão
Porém, foi assassinado
Como foi o meu Lampião.

Yoko:
Neste ponto, tens razão,
Ó criatura rural!
Pois a dupla sucumbiu
Na busca de um ideal:
O Lennon buscando o bem
E o teu Lampião, o mal.

Maria:
Se ele usou o seu punhal
Na labuta do cangaço
Foi para fazer justiça
Com fé e sem embaraço
Numa afronta aos coronéis
Que mandavam no pedaço.

Yoko:
Virgem fica sem espaço
Nas andanças do teu bando
Pois o grupo em algazarra
Pela mata ia estuprando
As donzelas mais bonitas:
Era assim, de quando em quando.

Maria:
Já que queres me lembrar
De pendenga sexual
No bando de Liverpool
Tinha um rapaz genial
Que traçava gente moça
Mesmo intelectual.

Yoko:
Não compare o bem com o mal
Catitinha do sertão
O John Lennon tinha estampa
Era um tipo bonitão
Tinha os seus cabelos longos
E artefato na visão.

Maria:
Parece é com Lampião
A sua descrição veemente
Pois Virgulino ostentava
Sua fama de valente
Com uns óculos redondinhos
E cabeleira decente.

Yoko:
Tu tens fama de valente
E és bastante atrevida
Em comparar o teu marido,
Semelhança merecida,
Porém, a mente, do meu
Tem pureza garantida.

Maria:
Não se faça de vencida
Japonesa alvoroçada.
Tu mandas no teu marido
E ele só tem fachada;
Os ingleses que o digam
Sua cobra disfarçada.

Yoko:
A nossa rainha amada
Deu-lhe um título de valor
Membro do Império Britânico
Foi cedido a primor
Devido a sua importância
O chamaram de senhor.

Maria:
Ele viveu o esplendor
Na certa, bem merecido;
Todavia, Lampião
Não ficaria esquecido;
O título de Capitão,
Deu-lhe as tropas, do partido.

Yoko:
O governo ressentido
Com o Carlos Prestes em ação
Cedeu-lhe a nobre patente,
Mas não deu de coração,
E jogo de interesse
Para mim não vale, não!

Maria:
O jogo da sedução
Habita todo Poder.
A rainha Elisabeth
Também quis enaltecer
Os interesses do Reino
E a todos favorecer.

Yoko:
A mídia lhe dá prazer,
Vejo bem em seu olhar,
Pois falas com emoção
Ao, este tema, abordar
A política te fascina
Você não pode negar.

Maria:
Insisto em acreditar
Que um dia vencerei,
Pois com a vida cangaceira
Jamais edificarei;
Porém, temo que este sonho
Eu jamais construirei.

Yoko:
O sonho é o nosso rei
É o nosso grande acalanto
Você sonha em ser livre
Eu já sonho com o canto
O canto da paz fraterna
Para mascarar o pranto.

Maria:
Na realidade eu me espanto
E o meu sonho de desfaz;
Não acredito em mais nada
Tenho esperança fugaz
E o seu John Lennon querido
Nunca foi um bom rapaz.

Yoko:
Você nunca terá paz
Com amargura tamanha.
Mesmo você bem trajada
E com toda essa artimanha
Nesse modelo esquisito
Até parece uma estranha.

Maria:
A minha grande façanha
No sertão ou na cidade
É trabalhar bem o couro
Com enorme variedade
Bordar, cozer e cerzir
Dá-me enorme vaidade.

Yoko:
Com toda cumplicidade
Quero aqui me permitir
Dizer que o John Lennon tinha
Nobre gosto no vestir
E sendo ele bem vaidoso
Sempre soube construir.

Maria:
Eu venho aqui garantir
Que o Virgulino disputa:
Em moda, ele é mais esperto
Que qualquer filho da puta,
Desculpe o atrevimento
Mas você não me recruta.

Yoko:
Você não sabe a labuta
De vestir-se bem decente
O Lennon, em várias lojas,
Só compra roupa atraente
Diferenciando o ídolo
Do normal de muita gente.

Maria:
O ídolo é quem faz a mente,
Muda o costume do novo,
Porém, Lampião é mito
E o mito quem faz é o povo
Sua roupa não é comprada,
É autêntica como um ovo.

Yoko:
Repita você, de novo,
Que Lampião é o melhor!
Na criação e no canto
O Lennon é muito maior
Na busca da liberdade
A guerra ficou menor.

Maria:
No quanto pior, melhor,
O cangaço teve astral
Na escopeta, na bala,
Nós fizemos tudo igual
Na busca da liberdade
A guerra foi natural.

Yoko:
O Lampião fez por mal
Tantas coisas no sertão:
Capando homens de bem
Roubando feito ladrão
Foi pior que Satanás,
Isso eu não entendo, não!

Maria:
Homem de bom coração
No bom Deus ele acredita
O Lampião tinha a fé
O Lennon tinha a catita
No chão, foi tão conhecido
Quanto Jesus, ele cita.

Yoko:
A sua filha Expedita
Sabe que não foi assim.
Quando falou em Jesus
Não foi querendo ser ruim
Só quis demonstrar prestígio,
Ele confessou a mim.

Maria:
Você foi o estopim
Do sonho que acabou
Manipulou o John Lennon
O seu fã-clube frustrou
Desfez a Beatlemania
Sua mão pequena abalou.

Yoko:
A mão pequena afastou-me
Do sonho bom do meu pai
De tornar-me pianista,
A lembrança não me sai.
Daí, passei a cantar
Pois o sucesso me atrai.

Maria
Tua mão pequena não vai
Dedilhar num recital
Bem diferente de mim
Que tem um par bastante igual
E que com habilidade
Manuseio o meu punhal.

Yoko
Cabeçuda sem astral
Você só ver violência
Lennon elevou a cabeça
Pela sua inteligência
E pregou a paz no mundo
Com bastante paciência.

Maria
Não venha com eloqüência
Desmerecer o cangaço
Tivemos um ideal
Preenchemos nosso espaço
Também tivemos cabeças
Não víamos um embaraço.

Yoko
No sufoco do mormaço
Da caatinga abandonada
Vi o teu herói nordestino
Ter a cabeça elevada
Não por ter inteligência
Mas por tê-la decepada.

Maria
Fico decepcionada
Pela maneira brutal
Que você retrata o mito
Como de fosse um animal
Porém demonstro a você
Um Lampião imortal.

Yoko:
Eu sou internacional
E devo admitir:
Que o cangaço teve história
Fez o oprimido sair
Clamando por liberdade,
Só desejando ir e vir.

Maria:
Crendo muito no porvir
Sou também universal
Os Beatles fizeram história
Lennon tornou-se imortal
Clamando por liberdade
Pregou o amor fraternal.

Yoko e Maria:

No tablado da vida vai crescer
A esperança do povo em tom de crença
Desistindo, porém, da desavença
Que nutria o cangaço pra valer.
John Lennon lutou pra fortalecer
O seu franco ideal de liberdade.
Lampião trabalhou com crueldade
Pra justiça social crescer valente
Matou cabo, soldado e muita gente
Nessa luta cruel por igualdade.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Cordel e cangaço (Pernambucano de Mello)



O CORDEL COMO FONTE DE PESQUISA



É comum se encontrar textos dizendo que o cordel desenvolveu-se no Nordeste Brasileiro como veículo condutor de notícias, informações, as quais eram passadas em sessões informais de leitura dos folhetos ou nos encontros de violeiros.


Outro dia, vi até na revista “BRASIL: almanaque de cultura popular”, que é distribuída nos vôos da TAM, uma matéria assinada por Mariana Albanese, na qual autora referia-se ao cordel como “uma literatura popular, com características genuinamente brasileiras”, e prosseguia: "Meio de comunicação de massa, o 'jornal do sertão' faz a crônica de sua época e ainda hoje se destaca em feiras e mercados de cidades como Juazeiro do Norte, Recife e Campina Grande".(Nº 89, agosto de 2006).
Hoje, porém, quero destacar o cordel, não apenas como meio de comunicação, mas como fonte de pesquisa histórica e sociológica.
Terminei de ler o livro “GUERREIROS DO SOL: violência e banditismo no Nordeste do Brasil”, de Frederico Pernambucano de Mello, e chamou-me a atenção o quanto o cordel é utilizado pelo autor no desenvolvimento do seu trabalho, aliás, um belo trabalho. Cada capítulo tem como epígrafe uma estrofe do tipo:


Rio Preto foi quem disse
E, como disse, não nega,
Leva faca, leva chumbo,
Morre solto e não se entrega.
(verso de pabulagem bradado em combate pelo famoso cangaceiro da segunda metade do século XIX, cf. Luís da Câmara Cascudo, Flor de romances trágicos, 1966.

Como ninguém ignora
Na minha pátria natal
Ser cangaceiro é coisa
Mais comum e natural;
Por isso herdei de meu pai
Esse costume brutal...
(Francisco das Chagas Batista, A história de Antonio Silvino, s.d.).

Mas a obra não se limita a usar a poesia popular nas epígrafes. Um exemplo bom disso encontrei nas páginas 65 a 67, nas quais a obra trata da figura do valentão, homem que não era tido como fora da lei, mas que, segundo o autor, “enganchava a granadeira e, viajando léguas e mais léguas, ia desafrontar um amigo, parente ou mesmo um estranho que tivesse sofrido algum constrangimento ou humilhação”.
Para dar uma idéia do sentimento do povo sertanejo em relação aos valentões Frederico Pernambucano De Mello lança mão dos versos do poeta Manuel Clementino Leite, antigo versejador do sertão paraibano, do século XIX. O trecho do livro é o seguinte:


Clementino aponta a origem histórica do valentão através de uma ilustre ascendência bíblica; estrema-a do cangaceiro, a seu ver, uma figura moralmente menor; sustenta que a probidade não se mostrava nele incompatível com a vida de questões; caindo finalmente num justificável casuísmo, em que aponta os grandes do seu tempo e, por certo, da sua admiração de sertanejo e de poeta:

Desde o princípio do mundo
Que há homem valentão
Um Golias, um Davi,
Carlos Magno, um Roldão
Um Oliveira, um Joab,
Um Josué, um Sansão.

Eu não chamo valentão
A cangaceiro vagabundo
Que quer ser um Deus na terra
Um primeiro sem segundo
Que vive a cometer crimes
E ofender todo mundo.

Tenho visto valentão
Ter sossego e viver quieto
Morando dentro da rua
Comprando e pagando reto
Trabalhar, juntar fazenda
Deixar herança pr’os neto.

Só se esconde o valentão
Que vive com o pé na lama
José Antonio do Fechado
Morreu em cima da cama
Brigou, matou muita gente,
Morreu mas ficou a fama.

Eu três homens valentões
No Pajeí conheci:
Quidute, Joaquim Ferreira,
E José Félix Mari
Mora dentro de Afogados
Tem grande negócio ali.

Mais adiante, nas páginas 178 a 180, o autor, já dissertando sobre os cangaceiros, fala do grupo dos Guabiraba, e mais uma vez busca apoio na poesia popular:


Ainda no meado do século [XIX], passaram a atuar os Guabiraba, sob a chefia dos irmãos Cirino, Jovino e joão, e do cuhado destes, Manuel Rodrigues. “Naturais da vila de Afogados da Ingazeira, ao pé da serra da Baixa Verde, no sertão pernambucano, fizeram-se bandidos nas escolas do Pajeú de Flores, onde praticaram tantos crimes que foram obrigados a fugir para Teixeira, na Paraíba”, eis o retrato que nos fornece Gustavo Barroso [...]. Em sua faina de poeta a seu modo historiador, Leandro Gomes de Barros pinta o gupo de Cirino com traços bem carregados;

Os Guabiraba eram um grupo
De três irmãos e um cunhado,
Todos assassinos por índole,
Cada qual o mais malvado
Aquele sertão inculto
Tinha essas feras criado.

A audácia do bando transparece clara nestes versos, pedaços de um antigo ABC de autor tão inculto quanto inteligente, com que se obtém uma reconstituição bem mais precisa da situação descrita, particularmente do clima épico em que se feriam as disputas que envolviam cangaceiros:

Agora estou me lembrando
Do tempo dos Guabiraba...
O capitão Zé Augusto
Cercou a serra e as aba,
Encontrou os cangaceiros
Quase Fagunde se acaba!

Cercou a serra e as aba
Com trinta soldado junto,
Falou para os cangaceiros:
São pouco! Apareça muito!
Tomou a boca da furna
Trouxe carga de defunto.

Deram fogo duas horas,
Bala na serra zoando,
Com a distância de três léguas
Todo o povo apreciando
E o povo todo dizendo:
Fagunde tá se acabando!

Enéas foi dos primeiro
Como o mais influído...
O capitão disse a ele:
Cabra, não seja atrevido,
Receba beijo de bala
No mole do pé do ouvido!

Foi um beijo envenenado
Como besouro estrangeiro
A bala beijou na fonte
Já se viu tiro certeiro
E isso serviu de exemplo
Pro resto dos cangaceiro...

Guerreava o capitão
Com dezoito cangaceiro!
Passando bala por bala,
Como troco de dinheiro,
Matou dois, baleou três,
O resto depois correro...

Homes bem afazendado
Viu toda sua riqueza
Descer de águas abaixo,
Contra a sua natureza,
Por causa do cangaceiro
Foi reduzido à pobreza.

Mandou o chefe da turba
Retirar os baleado,
Que o sague regava o chão
Como em matança de gado
E disse, devagarinho:
Os macaco tão danado!

Nada se pode fazer!
Guardemos para o futuro...
A noite está que nem breu,
Ninguém enxerga no escuro,
Pode ser que em outro “baile”
A gente atire seguro.



É isso. Dá gosto ver o cordel registrando os fatos, comentando os movimentos políticos, descrevendo os fatos pitorescos da nossa história. Parabéns a Frederico Pernambucano de Mello, que soube ir buscar nessa fonte matéria prima para o seu trabalho.


E o melhor é que, basta ir a uma feira de muitas cidades do Nordeste, para ver que o cordel continua lá fazendo esse mesmo trabalho, e com temas atuais. Na Internet também tem aparecido muita coisa. Mundo Cordel é um espaço que está sempre à disposição para colaborar.