domingo, 16 de dezembro de 2012

Livro de Eduardo Macedo




O BOI MORRE-NÃO-MORRE

Eu havia chegado de viagem, quando vi na correspondência acumulada da semana um envelope amarelo que se destacava das malas diretas de final de ano e dos boletos bancários. Não só pelo peso e volume, mas principalmente por que meu nome e endereço estavam escritos à mão, e não em uma etiqueta impressa em série.

Era um livro. Um livro pequeno, com as dimensões de um folheto de cordel, exceto no que se refere ao número de páginas, cento e vinte ao todo. O conteúdo também era em cordel. Abri-o aleatoriamente e logo vi as setilhas. 

Não havia lido uma página sequer, ouvi o telefone tocar. Deixei o livro ali mesmo, sobre a mesinha da sala e fui atender. Antes, olhei o remetente, dobrei o envelope e o enfiei entre as páginas do livro. “Quando lançar o meu próximo livro, retribuirei a gentileza do autor” – pensei.

Vida louca, essa do século XXI. Só hoje, quase uma semana depois, abri o livro novamente.

Quatro folhetos de cordel foram reunidos nele. Detive-me no primeiro, que dá título ao livro: “O Boi Morre-não morre”. Apropriada leitura para um domingo no qual algumas nuvens cinzentas pairam sobre o céu de Fortaleza, trazendo a esperança de que alguma chuva caia sobre o meu Ceará, ainda neste mês de dezembro. 

E que bom seria se chovesse mesmo, não apenas em dezembro, mas por toda a chamada quadra invernosa de 2013. A seca está malvada por aqui. Li recentemente em um jornal que desde 1950 não havia uma dessas.

E, por mais que poetas como Eduardo Macedo façam o milagre de transformar em poesia o sofrimento causado pela seca no sertão, é sempre dolorido ler versos como os que abrem o a história do Boi Morre-não-morre:

Queima, o sol, a sua brasa de matar.
Oprimindo, inclemente, causticante.
Sua espada de brilho rutilante
Golpeando, letal, a castigar.
Vendo a vida na terra evaporar,
O Boi, magro de fome e de esperança,
Sem ter vestígio d’água na lembrança,
Resolveu sua fuga empreender,
A fim de resgatar sua sustança.

Era um couro engelhado, era uma ossada,
Desidratado espécime de rês
Duma seca que já durava três
Anos sem ter sede saciada.
Olhos foscos na cara descarnada,
Chifres (chumbo?) na cabeça pendente,
Na bocarra esticada cada dente
Simulava um sorriso desgraçado – 
Era o Boi renegando o triste fado,
Sem se entregar à morte, renitente.

Que bom seria, meu caro Eduardo, se nos próximos meses a inspiração chegasse a você por meio de grossos pingos de chuva caindo sobre a terra seca do sertão, enchendo os leitos dos rios e pintando de verde a caatinga!

Grato pelo livro que me presenteaste, envio-lhe o meu abraço e votos de sucesso!

Para saber mais sobre a obra de Eduardo Macedo, visite eduardomacedo.com.br.