segunda-feira, 19 de abril de 2010

Cordel sobre Tiradentes


O MÁRTIR DA INDEPENDÊNCIA

Estive ontem na Bienal do Livro, aqui mesmo em Fortaleza, e tive o prazer de encontrar com o grande cordelista ARIEVALDO VIANA, a quem tenho a hora de chamar de amigo e colega da arte de escrever cordéis.

Generoso, o amigo me presenteou com vários de seus cordéis - cada qual o melhor - inclusive um altamente oportuno para esta semana, sobre Tiradentes, o mártir da independência.

O cordel é de autoria do próprio ARIEVALDO VIANA, em parceria com outro grande cordelista, ZÉ MARIA DE FORTALEZA, publicado em folheto de dezesseis páginas pela editora Tupynamquim, com capa de KLÉVISSON VIANA, que, além de também ser um grande cordelista, desenha bem que só ele mesmo.

Bem, não dá pra por o cordel todo aqui, mesmo porque a obra é uma biografia detalhada, que levaria um bocado de tempo de digitação. Então, quem quiser ver o texto completo deve entrar em contato com a editora por um desses caminhos: tupynamquim_editora@ibest.com.br ou http://fotolog.terra.com.br/tupynamquimeditora2071.

Seguem alguns trechos do cordel:


TIRADENTES
Um sonho de liberdade
Zé Maria de Fortaleza e Arievaldo Viana





Num Brasil de tantos Silvas
Quero falar do primeiro
Que embalou nossa pátria
Com um sonho verdadeiro
Foi Joaquim José da Silva
Um grande herói brasileiro.

(...)

Trata-se de um grande herói
Que seus dons proeminentes
Os colocaram no rol
Dos grandes inconfidentes
Foi Joaquim José da Silva
Xavier, o Tiradentes.

Nasceu no século dezoito
No ano quarenta e seis
No Distrito de Pombal
Que lembra o grande Marquês
De Pombal, que foi ministro
Do reinado português.

(...)

Seu padrinho era dentista
E por razões evidentes
Ele aprendeu logo a arte
E por questões decorrentes
Da profissão, lhe custou
A alcunha de Tiradentes.


Na profissão de dentista
Não quis mais continuar
E resolveu investir
Na carreira militar
Foi comandante das tropas
Sem nada lhe intimidar.

(...)

Tiradentes, um plebeu
De origem muito pobre,
Conviveu por algum tempo
No meio de gente nobre
E ante tanta injustiça
Sua vocação descobre.


Viu que a nação brasileira
Não estava satisfeita
Com as ordens lusitanas
E a cobrança suspeita
Percebeu que tal proposta
Por muitos não era aceita.

(...)


Era um homem inteligente
De ampla e clara visão
Um sonho de liberdade
Movia seu coração
Livrar o Brasil Colônia
Do jugo da opressão.

(...)

Tiradentes e seus pares
A justa revolta urdiram
Porém os planos vazaram
Num precipício caíram
Joaquim Silvério e mais dois
Ouviram tudo e o traíram.

(...)

Antes da revolução
Chegar a hora e a vez
A notícia foi levada
Ao Vice-Rei português
Pelo delator infame
Joaquim Silvério dos Reis.

(...)


Prenderam então Tiradentes
Na Rua dos Latoeiros
Já na prisão recebeu
Notícias dos companheiros
Que também estavam presos
Pra revolta dos mineiros.

(...)


A vinte e um de abril
No ano noventa e dois
Daquele século dezoito
A maldade disse: “Pois
Sendo assim, massacrem o réu
Para enforcá-lo depois.


Foram percorrendo as ruas
Lá do Rio de Janeiro
Desde a cadeia ao patíbulo
Levando o prisioneiro
Que apesar do sofrimento
Tinha um semblante altaneiro.


Ao contrário do que os livros
De história têm mostrado
Ele subiu ao patíbulo
Com o cabelo raspado
Trajando uma longa túnica
Por um carrasco puxado.


(...)

Ele cumpriu sua sina
Bastante resignado,
Sonhando ver seu País
Da opressão libertado,
Depois de morto, o herói
Foi também esquartejado.

(...)


Somente com a República
O nosso herói Tiradentes
Virou personalidade
Histórica entre os combatentes
E foi cognominado
Mártir dos inconfidentes.

sábado, 3 de abril de 2010

Livro de Cordel

Junto com meus novos livros, recebi - gentileza do amigo Pádua, da Ensinamento - um exemplar da nova obra de MOREIRA DE ACOPIARA, também editada pela Ensinamento. O título do livro é "Atitudes que constroem" e abre com a seguinte poesia:

PARA VENCER NA VIDA
Moreira de Acopiara

Quem quer vencer nessa vida
Não fica em cima do muro,
É carinhoso com os pais,
Tem fé, visão de futuro,
É justo, determinado,
Simples, honrado e seguro.

Respeita, faz amizades,
Sabe o valor do perdão.
É calmo, tem bom caráter,
Possui determinação,
Pois já sabe que isso deixa
Melhor qualquer cidadão.

Exercita a liderança
E a solidariedade.
É companheiro, é humilde,
Vive com simplicidade,
Pois sabe que isso projeta
O homem na sociedade.

É capaz, tem paciência,
Compromisso e bom humor;
É companheiro fiel,
Honesto, trabalhador;
Tem caráter impecável
E um coração só de amor.

Esses gestos e atitudes
Não sufocam, não corroem,
Não atrasam, não desgastam,
Só engrandecem e não doem.
Foi por isso que escrevi
Atitudes que constroem.

terça-feira, 30 de março de 2010

Cordel sobre o dia da mentira

O SURGIMENTO DA MENTIRA NO BRASIL
Manoel Messias Belizario Neto
http://www.cordelparaiba.blogspot.com/


 
Leitor para ser um homem
Ou uma mulher de verdade
A criatura precisa
Ter no mínimo honestidade
Que é a mãe dos princípios
Morais de uma sociedade.


Hoje em dia é comum
Homem e mulher de mentira.
Nesse verso vou narrar
De onde isto surgira.
Trazer à tona a verdade.
Esta é a minha mira.

Toda a saga tem início
Nas plagas de Portugal
Ainda na construção
Da esquadra de Cabral.
A mentira se escondeu
No porão de uma nau.


Coitada quase morreu
De calor, fome e sede.
Porém aguentou calada,
Encostada na parede.
Pensando:’que bom seria
Se já existisse rede’!

Quando em 1500
Cabral chegou no Brasil
A mentira, de fininho,
Do seu recanto saiu.
Passou pelos tripulantes.
Pulou no mato e sumiu.

A verdade já morava
Nas terras de Pindorama.
Ninguém avisou a ela
Para apagar as chamas
Que a mentira acendia
Em favor de sua trama.

A mentira foi ganhando
Importância no reinado.
Disfarçada de verdade
Tinha todos do seu lado.
Portugueses e indígenas
Por ela foram enganados.

Já a verdade, coitada,
Caiu numa confusão.
Confundida com a mentira
Foi levada à inquisição.
Escapando da fogueira
Exilou-se no sertão.

Por isso que no sertão
Inda hoje tem sofrimento.
Porque a verdade quer
Eleger seu movimento.
Mas a mentira vem antes
E conquista o parlamento.

Com a verdade exilada
A mentira ganha fácil.
Vai abrindo filiais
No país sem embaraço.
Aonde hoje é Brasília
Ela constrói seu palácio.

Nos fundos deste palácio
Ela faz seu cemitério.
Quem foi enterrado lá?
Até hoje é um mistério.
No lugar hoje se encontra
O prédio dos ministérios.

Já em 1700
Com o mundo modernizado
A mentira deicidiu
Abandonar seu reinado.
Em pouco tempo o palácio
Estava arruinado.

Na década de 50,
Coitado de JK!
Inocente escolheu
O mesmíssimo lugar
Que a mentira habitou
Para a Brasília implantar.

Pou um tempo no país
Houve paz e harmonia.
Foram buscar a verdade.
Deram-lhe a anistia.
Pena que a tempestade
Vem depois da calmaria.

Porque a mentira estava
Na Europa passeando
Quando viu numa esquina
Um jornaleiro gritando
Que a capital brasileira
Estaria prosperando.

A mentira ao vir a foto
Conheceu na mesma hora.
Passou um desconhecido
E perguntou: ‘por que chora’?
A mentira disse:’eu
Estou muito triste agora’.

‘Há alguns anos atrás
E morei em um país.
Lá fiz amigos, riqueza,
Aprontei tudo o que quis.
Escolhi um lugar lindo
E ergui uma matriz.’

‘Por estar podre de rica
Resolvi abandonar
O país e me botei
Por este mundo a andar.
Curtir a vida e também
Outro povo atasanar.’

‘Vi agora no jornal
Que minha linda morada,
Construída com suor,
Dela não resta mais nada.
Fizeram uma cidade
Onde ficava a coitada.’

‘Sabe de uma coisa, amigo,
Farei a seguinte trilha:
Vou retornar ao Brasil,
À cidade de Brasilia.
O bom filha a casa torna,
Para rever a família’.

‘Quero de volta o palácio
Porque é meu de direito.
Se eu não for atendida
Levarei tudo no eito.
Dissemino a inverdade.
Todo o país desajeito.’

Ao dizer isto partiu
De trem, rumo aoceano.
Pegou o primeiro navio.
Tracou um único plano:
Ou tinha tudo de volta,
Ou espalharia dano.

Numa tarde de verão
Ela aporta na Bahia.
Vê um Brasil diferente
Daquele que conhecia.
Agradou-se do lugar,
Porém ficar não podia.

Quando chegou em Brasília
Ficou muito emocionada
Ao rever aquelas terras
Que fora sua morada
Cheia de gente vivendo
Em casas modernizadas.

Avistou a Esplanada
Dos Ministérios pomposa.
Disse: ‘não tenho o palácio,
Minha mansão fabulosa.
Mas tenho em seu lugar
Uma construção honrosa’.

'Sabe de uma coisa, amigo,
Não quero a morada antiga.
Vou ficar é nesta nova.
Besteira entrar em briga.
O chalé aqui é grande.
Qualquer quartinho me abriga.’

A mentira se instalou
No prédio da Esplanada
Do Ministérios e até
Hoje lá está plantada.
Vez em quando sai da toca
Pra tomar sol na calçada.

Às vezes ela percorre,
Em excursão, o Brasil.
Depois volta alegremente
Com um olhar infantil
À sua eterna morada.
Tem recepção gentil.

Por isso, caros leitores,
Que temos corrupção.
Não culpe a classe política.
Dê a ela seu perdão.
A culpa é dessa mentira
Em constante tentação.

Autor: Manoel Messias Belizario Neto
http://www.cordelparaiba.blogspot.com/

domingo, 28 de março de 2010

Promoção Novos Livros - Resultado


OLHA OS VENCEDORES AÍ, GENTE!

Caros leitores,

Aí está a lista dos ganhadores dos livros da PROMOÇÃO MUNDO CORDEL, do dia 18 de março de 2010. Se você enviou um pedido e seu nome não está na relação abaixo, entre em contato imediatamente comigo para que eu possa fazer a correção. Se já recebeu, seria legal por um comentário aqui confirmando o recebimento e, quem sabe, sobre o livro.

1. Arievaldo, Caucaia-CE: “O jumento que Jesus montou”

2. Edilson, Recife-PE: “A cartomante”

3. Gilbamar, Parnamirim-RN: “O jumento que Jesus montou”

4. Priscila, Camaçari-BA: “O jumento que Jesus montou”

5. Rafael, São Paulo-SP: “O advogado, o diabo e a bengala encantada”

6. Marcos, Brasília: Todos os livros

7. Porto Neto, Fortaleza-CE: “O jumento que Jesus montou”

8. Anabela, Agualva-Cacém, Portugal: “O viajante e o sábio”


9. Anizio, Campina Grande-PB: Todos os livros

10. Kydelmir, Mossoró-RN: Todos os livros [pedido feito via e-mail]

11. Eduardo, Natal-RN: “A cartomante” [pedido feito via e-mail]

12. Fábio, Mossoró-RN: “A cartomante”

13. Ana Luiza, Fortaleza-CE: "A cartomante"

14. Alexandre, Fortaleza-CE: Todos os livros [pedido feito via e-mail]

15. Rokatia, Apodi-RN: "O viajante e o sábio"

16. Vicente, Fortaleza-CE: "O viajante e o sábio"

17. Jânio, Fortaleza-CE: "O viajante e o sábio"

sexta-feira, 26 de março de 2010

Estudo sobre a literatura de cordel

Histórias de Poetas
(do livro "A literatura de cordel no Nordeste do Brasil", de Julie Cavignac. Tradução Nelson Patriota)

Literatura de cordel é o nome que se dá à literatura popular ibérica vendida nas ruas pendurada em barbantes (BAROJA, 1988). A lenda dos fascículos das edições Luzeiro faz referência explícita ao uso do barbante tanto em Portugal como no Brasil:

O nome literatura de cordel provém de Portugal e data do século XVII. Esse nome deve-se ao cordel ou barbante em que os folhetos ficavam pendurados, em exposição. No Nordeste brasileiro, mantiveram-se o costume e o nome, e os folhetos são expostos à venda pendurados e presos por pregadores de roupa, em barbantes esticados entre duas estacas, fixadas em caixotes.

Essa definição sumária e folclórica, que insiste na origem ibérica do folheto, não reflete em nada a realidade da literatura popular em verso ainda bastante viva e muito original, mas resume bem os traços caricaturais geralmente ressaltados para descrever o fenômeno aos turistas e aos curiosos.

A literatura de cordel do Nordeste brasileiro começou a aparecer sob sua forma atual no fim do século XIX (TERRA, 1983, P. 1-16). São relatos em versos difundidos sob a forma de livretos de oito, dezesseis ou trinta e duas páginas. Até 1917, Ruth Terra observa que os folhetos de dezesseis páginas dominam, e isso até 1930. Aparecem romances de trinta e duas e quarenta e oito páginas. Nesse caso, algumas histórias se dividem em vários volumes: os diferentes episódios podem ser reagrupados depois em um só livro – são as “histórias completas” (TERRA, 1983, P. 33-45)[1]. Distinguem-se, de fato, os folhetos, mais curtos, dos romances por seu número de páginas e pelo assunto tratado. Os folhetos que tratam de um problema particular são, antes de tudo, destinados a informar, por isso abordam de preferência temas da atualidade. Os romances, por sua vez, descrevem mundos maravilhosos onde os heróis vivem mil e uma aventuras, sofrem, amam, vingam-se, são traídos e são sempre recompensados no fim. A “história completa”, forma abandonada hoje, era publicada em vários volumes e podia comportar até sessenta e quatro páginas. Impressa em papel de má qualidade, a história é ilustrada por um desenho, uma fotografia ou ainda uma gravura sobre madeira, chamada xilogravura, técnica que experimentou um desenvolvimento autônomo, paralelamente à literatura de cordel. As vinhetas – desenhos destinados a ilustrar a capa ou, mais raramente, a história – dominam até 1930. As fotografias, que podem ser reproduções de artistas de cinema ou de cartões postais, aparecem por volta de 1914. Contrariamente ao que se poderia acreditar, no cordel e nas xilogravuras aparecem simultaneamente aos clichês, e esta técnica teria sido adotada para atender à escassez de fotografias em tempos de guerra. Com efeito, a primeira menção a uma xilografia data de 1935, e esse processo se desenvolveu nos anos quarenta. Os desenhos, por sua vez, aparecem principalmente nas capas dos folhetos recentes (SOBREIRA, 1948; SOUZA, 1981).

Como se trata de poesia, a versificação não pode faltar: sextilha, septilha ou décima são as formas mas correntes[2]. Esses relatos em verso são vendidos, declamados ou cantados nas feiras, nos centros de romarias e nos lugares públicos do Nordeste, tanto no interior quanto no litoral (DIEGUES JR., 1975; SOUZA, 1981). Eles são comercializados pelos próprios autores ou por revendedores que se deslocam de cidade em cidade. Os folheteiros, poetas intinerantes ou vendedores ambulantes, se distinguem dos poetas impressores. Estes últimos, que editam e publicam também prospectos eleitorais, calendários, cartões de felicitações, anúncios publicitários, conservam uma parte dos folhetos que produzem, a "conga", a fim de cobrir os custos de edição (ARANTES, 1982). Por exemplo, Francisco das Chagas Batista, proprietário da Tipografia Popular Editora, em João Pessoa, no começo do século XX, imprimia folhetos e "livros de prateleiras, faturas, envelopes, blocos para cartas comerciais, cartas, circulares, cartões comerciais, de visita, participação de boas festas" (TERRA, 1983, p. 27). O folheto aparece na feira geralmente no meio de outros objetos, à primeira vista sem relação com a atividade poética: revistas e livros de ocasião, coletânea de canções, almanaques, orações, rosários, pomadas milagrosas, raízes e plantas medicinais, brinquedos para crianças etc. Assim, se o poeta é artista, cantor, ele é antes de tudo comerciante e vendedor ambulante; seu microfone serve muitas vezes para fazer anúncios públicos na feira. Para anunciar, por exemplo, uma festa local. Ele recita, canta ou lê a última história que acaba de ser publicada, fazendo uma pausa antes do desfecho para que o leitor, curioso de conhecer o final, se apresse em comprar a inacreditável história da mula que fala (O jumento que falou no Nordeste), as facéias de João Grilo, as aventuras do célebre cangaceiro Lampião, o amor contrariado de Pedrinho e Juliana ou de Zezinho e Mariquinha, ou, enfim, a última profecia de Frei Damião, descrevendo em detalhes o apocalipse próximo[3].

Hoje, essa publicação artesanal é cada vez mais rara e a venda, no Nordeste, só está assegurada regularmente nos grandes centros urbanos e cidades do agreste (Recife, Fortaleza, João Pessoa, Natal, Caruaru, Campina Grande, Mossoró, Caicó etc.) e nas cidades-santuário - centros importantes de romaria que reúnem fiéis vindos de todos os estados do Nordeste e do país, como Juazeiro do Norte, Canindé ou Baturité, no Ceará. Encontram-se, irregularmente, folhetos nas feiras semanais das pequenas cidades do interior do Rio Grande do Norte, sendo que os folheteiros são atraídos pelos centros comerciais mais importantes. As tipografias artesanais são cada vez mais raras e os poetas recorrem com muita frequência à fotocópia para reduzir o custo elevado da impressão[4]. Os únicos folhetos que se encontram em grande difusão no Sul do país e, paradoxalmente, no Nordeste, são aqueles publicados pelas edições Luzeiro, de São Paulo, onde existe uma forte concentração de emigrantes nordestinos. Essa tendência, notada desde o começo dos anos 1980, principalmente por Antonio Arantes (1982) e Candace Slater (1984), confirma-se claramente dez anos depois, sem que se possa falar da morte do cordel, embora tantas vezes anunciada[5].

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NOTAS:

[1] O termo folheto será utilizado para designar tanto os romances impressos como os folhetos, a título de simplificação da exposição. É preciso também distinguir os romances publicados em folhetos dos romances cantados, que se encontram vivos na memória dos habitantes do litoral nordestino. O romanceiro do Rio Grande do Norte é conhecido através de Dona Militana, Militana Salustino do Nascimento, natural de São Gonçalo do Amarante, que canta dezenas de romances; é a mais famosa das romanceiras, por ter gravado um disco em 2002 intitulado Cantares (projeto Nação Potiguar) e ter recebido a medalha da Ordem do Mérito Cultural em 2005. São poemas octossilábicos cantados desde o século XV e XVI na Península Ibérica e que, no Brasil, encontram-se desde o século XVIII. No século XIX, foram coletados sistematicamente por Pereira da Costa, Celso Magalhães, Sílvio Romero, Gustavo Barroso, Câmara Cascudo e Jackson da Silva Lima (GURGEL, 1993; SANTOS, 1997).

[2] As sextilhas, septilhas ou décimas são estrofes de seis, sete e dez versos, com as seguintes estruturas: sextilha - ABABAB ou AABCCB; a septilha - ABCBDDB; a décima ou verso de dez linhas, obra de dez pés - ABBAACCDDC. Diz-se também cantar mote, pois o último ou os dois últimos versos é geralmente reservado ára servir de mote que, cantado pelos dois cantadores, serve de base para continuar a improvisação poética (Brasil caboclo, dez de queixo caído). Para mais detalhes, ver: Leite Filho, 1985; Linhares e Batista, 1982; Maxado, 1980; Romero, 1977; Santos, 1977.

[3] Cf. anexo para as referências dos folhetos.

[4] Cf. os folhetos de J. Dominsilva.

[5] Cf. A situação não se modificou substancialmente desde que o texto foi escrito: se não encontramos uma significativa renovação da produção, existem, porém, algumas tentativas de divulgação dos textos clássicos organizados em antologias, como na coleção Biblioteca de Cordel da editora Hedra, que já editou vários livros sobre a obra de poetas reconhecidos: Expedito Sebastião da Silva, Patativa do Assaré, Cuíca de Santo Amaro, Manoel Caboclo, Rodolfo Coelho Cavalcante, Zé Vicente, João Martins Athayde, Minelvino Francisco Silva, Oliveira de Panelas etc.

terça-feira, 23 de março de 2010

Cordel em Prosa



TOMÉ

Adauto Suannes


"Quando se aproximaram de Jerusalém e chegaram a Betfagé, junto do monte das Oliveiras, enviou Jesus dois discípulos, dizendo-lhes: Ide àquela aldeia que está lá adiante e logo achareis uma jumentinha presa e com ela um jumentinho; desatai-a e trazei-mos"

(Mt 21, 1-2 )



Eu tinha um cavalo chamado Tomé. Comia da alfafa, do arroz e feijão. Bebia cerveja, também guaraná. As flores amava, os prados corria, o ar respirava, com muita alegria. Meu bom cavalinho, chamado Tomé, também galopava, na ponta do pé. Plect, plect, plect, plé.

O dia nascendo, o sol bocejando e o bravo Tomé de há muito trotando. Tomé trabalhava, trabalhava e trabalhava. Meu pai, um leiteiro, inda madrugadinha, saía p'las ruas, com disposição. Mortinho de sono, papai na boléia balança pra lá, balança pra cá, ao trote miúdo do meu cavalim. Sabido, ensinado, Tomé dispensava ordens e mandos. Casa da Eulália, da Vera ou Rosinha, parava o cavalo, bem junto ao portão. Meu pai acordava, descia bem presto, pegava a garrafa e cumpria a missão.

Vai dia, vem dia; sai mês, entra mês; os anos passando, meu pai mais Tomé seu leite entregando. A neve do tempo - se diz na poesia - pintava o cabelo do nosso leiteiro. Tal como se o leite quisesse marcá-lo de um modo especial pra que se lembrassem, agora e no sempre, o que de lembrar carecia mais não. Feliz ele era, ali se dizia, entrega seu leite com sastifação.

Um dia na vila aparece um pastor. Parece afobado, tarveis preocupado, buscando, indagando, quem sabe lá o quê? Encontra meu pai, conversam bastante. Pondera um de cá; insiste um de lá. E eu só na janela, de longe espiando, mirando lá fora, sem nada entender. O homem - parece - termina a conversa. A mão no chapéu, sorriso na boca, despede-se humilde.

Meu pai entra logo. Eu corro pra ele, me atiro em seus braços. Costume já velho, que a gente mantinha, quando ele voltava, saudade era eterna.

- Senta fio, mode proseá.

O ar era grave, a gente sentia. Olhava pra o chão, então pra parede. Meu peito sentindo o ar rarear.

- Coisa grave, pai?

- Pense não. Escute premero, adespois entristeça, se caso.

Cheguei-me e sentei, fiado na fala, no rosto, nos gestos do pai que eu amava, amigo que era, certeza eu só tinha que tudo, por certo, melhor sairia, possível devera, no modo de ser.

- Diz que a léguas, coisa longe, tem um homem, bom de fato, carecendo de um jumento, pra mode entrar na cidade, no cumprir de uma promessa. Campearam pelas vilas, procuraram nos atalhos, removeram céus e terras, e jumento não acharam. Tomé, seu cavalim ...

Mais não disse. Carecia. Mãos cruzadas, rosto baixo. Eu quis falar coisa alguma. Não saiu. Imagens ficaram bailando nos olhos, lágrimas soltas corriam na cara. Ficamos parados, ali dois amigos, sem falar nem saber que dizer.

- Se é promessa, pai, que se cumpra. Quem somos nós diante de Deus? Deus dá - louvado seja! - Deus leva - louvado seja! Tudo é dEle, nada é nosso. Não foi isso que o sor me ensinou nesses tempos todos? Então por que o choro?

Meu pai ergueu o rosto e uma luz vinha lá da cara dele. Os olhos pareciam duas pedras preciosas, turmalindas brilhando, brilhando. Trocamos abraço longo, sentido, sem dizer palavra. Nem não carecia. Dia seguinte, manhãzinha, veio o moço buscar o Tomé. Levou. - É promessa, menino.

- Que se cumpra!

Cumpriu-se. No dia marcado, fui assistir a entrada do forasteiro na cidade. Tomé vinha todo enfeitado com flores nos arrelhos. Trazia a cabeça altiva, empinada. A pelugem branca até brilhava de tão limpa. À sua passagem, as pessoas atiravam flores no chão, que ele pisava com raro garbo. Folhas de palmeiras eram acenadas pra o Tomé, que balançava a cabeça, agradecido. Dava gosto ver sua alegria. Até parecia que ele se havia preparado a vida toda praquele momento. Um momento de glória, de consagração.

Tomé foi-se com o moço da promessa.

Vez em quando, tardinha, no repousar do sol, olhando o céu, parece que as nuvens formam a cara do meu cavalinho. Ele me sorri satisfeito. Conversamos longamente, até o sol se pôr de fato.

Maluquice a minha. Então já se viu cavalo entrar no céu?


______
Do livro "Cristo, hoje", Editora Loyola (esgotado)
Fonte: Migalhas, 22 de dezembro de 2006 - Nº 1.563.
Agradecimento: Este texto me foi encaminhado gentilmente por Abílio Pereira Neto, a quem agradeço, como também ao autor, Adauto Suannes, por esta rica contribuição para MundoCordel.

quinta-feira, 18 de março de 2010

PROMOÇÃO MUNDO CORDEL


GANHE LIVROS E DESCONTOS!

Caros amigos,

Acabo de receber os exemplares que correspondem aos direitos autorais dos meus novos livros, lançados pela Ensinamento Editora. Só para lembrar, são eles:
1) A Cartomante (adaptação do conto de Machado de Assis);
2) O Advogado, o Diabo e a Bengala Encantada;
3) O Jumento que Jesus Montou;
4) O Viajante e o Sábio;
5) Os Dois Soldados;
6) A História de Zé Luando, o Homem que Virou Mulher.



O preço de venda dos livros é R$ 12,00 (doze reais), mas os leitores de MundoCordel terão prioridade e facilidade em obter alguns desses exemplares. E quem for rápido, ainda pode ganhar livros GRÁTIS!



Primeiro:
Os primeiros vinte leitores que fizerem o seguinte comentário a esta postagem: “Quero ganhar o livro...”, indicando o título do livro, receberão, totalmente grátis, com frete por minha conta, um exemplar do livro escolhido.



Segundo:
Dentre esses primeiros vinte leitores, se o comentário for “Quero todos esses livros”, um livro seguirá grátis, e os outros cinco custarão apenas R$ 10,00 (dez reais) cada, sem frete, totalizando R$ 50,00 (cinquenta reais) a serem depositados em conta que informarei aos interessados.



Terceiro:
Para quem enviar seu comentário neste mês de março de 2010, mas não conseguir chegar entre os vinte primeiros - e perder essa moleza, o que será fácil conferir no próprio blog – estou dispensando o frete. Se comprar três livros ou mais, mantenho o preço de R$ 10,00 (dez reais) por exemplar.




ATENÇÃO: Não deixe de informar seu e-mail no comentário. Enviarei um e-mail a cada interessado, para formalizarmos a remessa do prêmio ou a compra.