terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Poesia de Mundim do Vale



POESIA LIMEIRIANA


Meu generoso amigo Mundim do Vale me enviou mais uma de suas obras. Dessa vez o tema é a carta escrita por Pero Vaz, quando do descobrimento do Brasil. Só que em uma versão limeiriana, que todo mundo sabe que era fantástico em rima e métrica, mas deixava a desejar na fidelidade aos fatos históricos. Afinal é de Zé Limeira a glosa que diz:


Pedro Álvares Cabral
Inventor do telefone
Começou tocar trombone
Na banda do Zé Leal.
Mas como tocava mal
Injeitou três instrumento
Jesus saiu lá de dento
Correndo atrás duma lebre
Quem for podre que se quebre
Diz o novo testamento.


Vejamos como ficou a carta limeiriana de Mundim do Vale. E obrigado, Mundim, por mais essa colaboração!


Carta de Pero Vaz segundo Zé Limeira

Mundim do Vale

Certa vez lá em Natal
Limeira tava cantando
Todo tempo misturando
Mossoró com Portugal.
Falava de carnaval
Numa casa de farinha,
Até que Zé de Ritinha
Perguntou: - Tu é perito?
Pois rime o que tava escrito
Na missiva de Caminha.

A carta:

Senhor rei de Portugal
Aos vinte e nove de abril
De um tronco de pau Brasil
Escrevo a carta real.
A viagem foi normal
Com as graças de Jesus
Que nos mostrou uma luz
Para uma ação pioneira.
Onde ergui sua bandeira
Na terra de Vera Cruz.

A terra aqui é tão boa
Que até já me acostumei
Confesso para o meu rei
Que já esqueci Lisboa.
A nativa sobe à toa
Na árvore pra chupar manga
Vestida só com uma tanga
Com o peito descoberto.
E a gente olha bem de perto
E a danada nem se zanga.

Não vou mais voltar aí
Pra não ter que trabalhar
Pois levo o tempo em pescar
E comer Índia tupy.
Vou ficar mesmo é aqui
Porque não sou abestado
Me esqueça no seu reinado
Que aqui tudo é maravilha.
Já comi até a filha
Do chefe Touro Deitado.

Tou fazendo um relatório
De tudo que acontece,
Dos índios fazendo prece
Na frente do oratório.
Já montei meu escritório
Na taba do feiticeiro,
Mas mande pena e tinteiro
E também papel paltado,
Que estou comprando fiado
A um cigano estradeiro.

Os índios querem adotar
O costume português.
O vício da embriagues
E a mania de trocar.
Não tenho como evitar
Essa permuta ilegal
Porque o próprio Cabral
Vive trocando arruela.
E até a índia mais bela
Já foi trocada por sal.

Quero também avisar
Pra meu rei tomar ciência
Que precisa providência
Urgente nesse lugar.
Os europeus vão chegar
Mudando a religião.
Vai chegar também ladrão
Para furtar à vontade,
Daí nasce a impunidade
Para a futura nação.

Chegou aqui um francês
Que é metido a bichinha
Ele esculhamba a rainha
E tudo quanto é português.
Aconteceu certa vez
Aqui no Monte Pascoal
Que ele assediou Cabral
Oferecendo o caneco.
Cabral quase teve um treco
Lá dentro do matagal.

Aqui já apareceu
O tal do esquentamento
Precisa medicamento
Que muita gente morreu.
Escute esse servo seu
Pra coisa não desandar,
A corte tem que mandar
Um médico para esse povo.
Eu mesmo já tou com um ovo
Em tempo de cozinhar.

Aqui já tem confusão
De índio com português
Já é a terceira vez
Que eu faço intervenção.
O nativo faz questão
De uma vida reservada,
Sem calçar nem vestir nada
E meu rei tem que entender
Que faz gosto a gente ver
Uma nativa pelada.

Prepare um navio cargueiro
Pra trazer equipamento,
Mande birô e acento
Pra seu fiel cavalheiro.
Eu passo um mês inteiro
Vivendo nesse sufoco
Recebendo muito pouco
Nessa minha sub-vida.
Já tou com a bunda doída
De viver sentado em toco.

O meu rei deve lembrar
Que a terra foi Deus que deu,
Depois vem o europeu
Querendo se apossar.
Os índios não vão gostar
Dessa perversa invasão
E vão entrar em questão
Mas não vão levar vantagem,
Porque somente a coragem
Não pode vencer canhão.

Não é bom meu rei mandar
Jogadores nem detentos
Pois esses maus elementos
Só servem para furtar.
É bom a corte cortar
O mal cheiro pela essência,
Pra não gerar descendência,
Dessa raça malfazeja.
Evitando que um esteja
Um dia na presidência.

Sei que vossa majestade
É o nosso rei soberano
Mas desenvolvi um plano
Pra essa comunidade.
Mostre a vossa autoridade
Agindo com inteligência,
Munido de coerência
E coragem de pra reinar,
Na hora de decretar
O ato da independência.

Se um dia meu rei vier
É melhor que venha só
Aqui se arranja xodó
Porque não falta mulher.
Índia não sabe o que quer
Nem manda botar baralho.
E pra findar meu trabalho
Assino na última linha.
Seu Pero Vaz de Caminha
Sarney Magalhães Barbalho.

3 comentários:

  1. Sensacional!! Muito bom....adorei...parabéns ao Mundim!

    Parabéns pelo excelente blog, voltarei com certeza!!

    Abraço,

    Rafael

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  2. Eu adoro ler,escrever,estudar,faço texto e poema,sem nenhum dilema,adoro,rimas e brincar com imãs tenho textos para colecionar tempo para cescer e em Deus crer

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  3. Foi num porto da Bahia
    Que Dom João chegou bem cedo
    Dava pra contar no dedo
    A bagagem que trazia
    Uma dúzia de bacia
    Dois fardos de algodão
    Gasolina de avião
    Do café trouxe a semente
    Duas bíblias uma de crente
    Outra do rei Salomão

    Cristo enforcou Jesus
    Na beira do rio Jordão
    Na noite de São João
    Num galho de cipó-cruz
    Comeu pirão com cuzcuz
    No meio da cabroeira
    Na noite de sexta-feira
    Cantou prosa e rezou missa
    José e Maria castiça
    Diria assim Zé Limeira

    No tempo da ditadura
    Eu rezei pro pai eterno
    Fez sol mas deu bom inverno
    Plantei fava e rapadura
    Veja só que formosura
    A “muié” de Barbosinha
    Se ela tivesse sozinha
    E o cachorro amarrado
    Eu levava ela prum lado
    E uma cuia de farinha

    O pai da aviação
    Por nome Drumon Andrade
    Sem dó e nem piedade
    Se atracou com Lampião
    Na bainha um facão
    Na matula um castiçal
    Gritou pra São Nicolau
    Acuda-me nessa hora
    Disse isso e foi-se embora
    Deixando um cartão postal

    Por causa da Ditadura
    O Brasil foi descoberto
    Um navio chegou perto
    Da curva da ferradura
    Dom Pedro fez a leitura
    Na borda da ribanceira
    Cabral trouxe uma cadeira
    Sem dó e sem ter clemência
    Proclamou a independência
    Diria assim Zé Limeira

    Jesus tirou diplomança
    De doutor em curamento
    No primeiro atendimento
    Passou a faca na pança
    Da mulher do rei da França
    Pra curar a joanéte
    Cego estando o canivete
    A mulher sentiu cosquinha
    Jesus com a cara lisinha
    Disse: "nega se aquete" !!

    Adão foi feito do barro
    Da beira do Rio da Anta
    Parou, bebeu uma Fanta
    Depois fumou um cigarro
    Tava passando um carro
    Com Madalena e João
    Ela tocando pistão
    Ele com a mão nos "joeio"
    Ergueu o dedo do meio
    E apontou pra Adão!

    O pai da "filosomia"
    Por nome Tristão da Cunha
    Teve encravada uma unha
    Prumodi um bãi d'água fria
    Gritô pra Virgem Maria:
    "Valei-me meu Pai Eterno
    Se não fizer bom inverno
    E meu feijão não vingá
    Vendo tudo que sobrá
    Vou pra feira e compro um terno"

    Dom Pedro e Napoleão
    Combinaram casamento
    Compraram apartamento
    Levaram cama e fogão
    Sem luz na escuridão
    Foi aquela "bagunceira"
    Funhaharam a noite inteira
    Depois ficaram de mal
    Hoje é um tal de quebra-pau
    Diria assim Zé Limeira

    Foi quando Napoleão
    Se elegeu Rei do Egito
    Menelau passou-lhe "um pito"
    Abolindo a escravidão
    Dom Pedro com um facão
    Disse: "O Brasil tá liberto"
    Lampião lá no deserto
    Achou aquilo engraçado
    Contratou um advogado
    Seu nome era Zé Roberto

    São João evangelista
    Rezou a missa do galo
    Foi no lombo dum cavalo
    Que Jesus cruzou a pista
    Desceu e mostrou a lista
    Com os quinze testamento
    Assoprou um pé de vento
    Rasgou cinco folha escura
    Só restou dez escritura
    Eu digo falo e sustento


    Um dia no paraiso
    Vi Caim chamando Adão
    Dizendo que o sacristão
    Na missa deu prejuizo
    Da cobra cortou o guizo
    Vendeu por cem mil cruzeiro
    Depois comprou um carneiro
    Assou porém não comeu
    Ouvi de um amigo meu
    Vai chover o mês inteiro

    Na cidade de Belém
    Por volta de meio-dia
    Vi passando uma cotia
    Com um bilhete de trem
    Deu duas notas de cem
    Prum vendedor de peneira
    Eu que voltava da feira
    Vi tudo e fiquei calado
    Mais um dia e tô casado
    Diria assim Zé Limeira

    Um artista aleijadinho
    D'um pau fez esculturança
    Mandou entregar na França
    No lombo de um jumentinho
    Não achando o lugarzinho
    Se livrou do carregado
    E passando num mercado
    Comprou vinho queijo e pão
    Passagem de avião
    Com o dinheiro arrecadado

    Um dia na Galeléia
    Tava Pedro acocorado
    Fazendo força um bocado
    Nisso passou uma "véia"
    "Sai pra lá sua mocréia"
    Disse Pedro em alvoroço
    Foi quando caiu um trôço
    E Pedro desenxavido
    Disse a velha: "ô trem fidido"
    E saiu pisando grosso

    Do cantar, foi no terceiro
    que o galo deu, quando Judas
    se enforcou em duas mudas
    grandes d'um abacateiro.
    Jesus foi quem viu primeiro,
    e fingiu saber de nada.
    Passou Pedro em disparada
    e gritou pra São Thiago:
    "Corre aqui e traz um trago,
    da cachaça amarelada."

    (Zé Roberto)

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